Vide-Entre-Vinhas
1967
1 - Não queria ser o quê?!
Não queria ser pobre, seria uma resposta. Interrogadas as gentes, dariam, por certo, variantes diferentes, à maneira de
pensar.
Não ser avarento, orgulhoso ou ladrão, assassino ou
preguiçoso. Que sei eu mais? Um longo rosário feito de respostas
que não acodem à mente duma só pessoa!
,Alguém se lembrou de pensar outra coia: ser mulher feia. Dava por argumento que havia-de ser esse o grande calvário, a luta de cada hora, o inferno da existência!
Criada a mulher para ser adjutório e enlevo do homem, sente-se ditosa, realizando o seu papel e obtendo, por sua vez,
reconhecimento e afecto acendrado .
Quando, porém, se vê postergada, enquanto a seu lado, outras
são ditosas, por serem alvo de enorme interesse e objecto de carinho, ela perde a tramontana e quase se desarranja. Nem
admira, afinal, que suceda isto!
Falhar redondamente, no campo da influência é, creio eu,
suprema desgraça! Resta uma saída: ideal religioso. Procurar, desde logo, outra aplicação que seja derivativo para a sua angústia e, ao mesmo tempo, ganho seguro para a eterdade.
Se perdeu a Terra, ainda tem o Céu, bem mais valioso! Do mal o menos! Já não é perder tudo, pois ganha o melhor!
Entretanto, se os pais são feios, que pode esperar-se?!Milagres? Só Deus os faz e quando Ele entende!
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2 .- A Poça do Carvalhal
Ensombrada como está por verdes castanheiros, com bela nascente de água fresquinha,era um regalo, em dias calorosos, que ela oferecia.
A sua fama estendia-se em redor, chegando muito longe. pois a sombra deliciosa de copado arvoredo era cobiçada pelos viandantes.. Por via de regra, encontrava-se alguém, que vgiava atentamente, pois os batatais suplicavam ansiosos, inclinando suas hastes, para o chão ressequido.
O remédio para os males estava na presa.. Por todo o arredor, era ela afinal que dessedentava homens e animais bem como as plantas. Entretanto, quão morosa avançava, para chegar ao termo!
Creio não errar dizendo que, à data, eram 4 semanas ou um pouco mais, para fazer o longo percurso! Aqui estava a razão, por que, uma vez ou outra, ficava sem rol. É verdade que, assim, apenas alguns se apropriavam da água. ( quem primeiro chegava, ficando a guardá-la, por noites e dias.).
Sujeita a rol, chegava a toda a parte, sedo limitados os dias atribuídos. No tempo de criança, lembro-me bem de havê-la guardado.
Nessa altura, havia ali perto uma velha nogueira , propriedade e usofruto do ti Manuel Marques. Pelo fofo do terreno e sombra acolhedora, espalhada à sua volta, faziam a cama debaixo da árvore, aproveitando o local, para certas limpezas
Por esta razão, o dono exasperava-se, arremessando os detritos, para junto da presa
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3 - A Bica
Sendo eu criança, havia na aldeia 3 fontes de mergulho e uma bica isolada: à Laja, ao Terreiro e a meio da Portela -- as ditas fontes; a caminho das Tapadas e já um tanto fora da povoação -- a Bica menccionada. Esta servia apenas uma parte da Portela e, quando Deus queria, todos os restantes da mesma rua.
O caso é que, uma vez por outra, sobrevinham, de improviso, horrorosas trovoadas que sempre inutilizavam a Fonte do Cão.
Em tais ocasiões, nem vestígios ficavam, na fonte da Portela. Os detritos arrastados enchiam, por inteiro o reservatório, divisando-se apenas montóes de areia e pedras variadas, enquanto do Chão da Fonte, ressumava água negra, bastante mal cheirosa
Nestas circunstâncias, ficávamos sem fonte, vindo logo à mente a Bica da Portela.
Um pouco longe, não era de tentar! Mas que fazer?! Outro remédio não havia ali! Lá íamos, pois, sempre rua acima, de cântaro na mão. em busca ansiosa da linfa apetecida. que iria matar a sede a homens e gados.
Constando, em geral, que era a mais limpa na localidade,
raramente alguém passava que não molhasse a boca.A primeira vez que passei por lá, fazia então caras à Tapada Serra. em companhia da prima Lucrécia.
A partir dessa data, janais a esqueci.
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4 - O Cemitério
Tremendo lugar, onde os restos mortais de quem maiis nos amou vão ficar desfeitos, a pouco e pouco!
Ali, só a morte campeia, infrene e despótica, sem a mínima atenção àqueles que sofrem. A tanto amor e extrenos de afecto...
à ternura incontida que do peito extravaza, vem suceder o funéreo lugar, que a tudo põe remate, lançando em angústia peitos extremosos
Cemitério horroroso, cujo só nome enche a minha alma de pavor e espanto. Por que é que não te somes, em fundo abismo?!
Assim, o teu nome não seria já lembrado!
Sacrílego gigante, de garras aduncas! Vieste ao mundo sem coração e teu sumo prazer é cevar ali a voracidade nos que tanto amei!
Condenam-se ao vivo os antropófagos? Tu, porém, ao que julgo, és por certo, mais digno de censura e mal-querer!
Na verdade, aqueles atiram-se apenas a seus inimigos, provendo à subsistência,
Bem ao invés, tu filas e rompes, sem necessidade nem
constrangimento, carnes e entranhas, santuário vivo de tanto amor1
Que palavras fortes hei-de eu encontrar, para traduzir a ninha indignação?!
Apesar do que aí fica, escrito a fogo, surge, à minha frente,
um grande farol, que desfaz as trevas e tudo ilumina: Cristo ressuscitado! Por este milagre, deveras estrondoso e reconfortante, hórrido cemitério, junto com a morte e o próprio, Diabo, ficais na penumbra, marcados e feridos, com a derrota!
É que esses corpos, desfeitos em pó, vão ressuscitar, já
imortais e muito mais belos do que os seres terrenos, sujeitos à morte e à corrupção!! Por estas razões, alegra-se e exulta o meu coração, no ante-gozo do encontro no Céu, com o nosso Deus e todos aqueles que amei, neste mundo.
Glória ao Senhor, pela sua bondade e supremo amor!
Emudece, pois, demónio tentador! Cala-te, morte, que foste aniquilada! E tu, cemitério, uma vez que só matéria, entulho e corrupção te alimenta o ser. não tens, realmente, de que orgulhar-te!.
Eu, sim, porque o Senhor Jesus, morrendo por mim, garantiu a minha entrada, nos eternos Umbrais da Cidade Celeste!
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5 - O Poço do Lameiro
No tempo das regas, é uma dor de alma! Ver os batatais , inclinando suas hastes, por modo suplicante e angustiador! Sem água bastante que vivifique, adeus tubérculos!
Por esta razão, recorre-se, em geral, a vários meios: troca ou venda, compra a dias, guarda permanente de presas vizinhas , durante algum tempo.
Era este, na verdade, o processo utilizado, no poço referido, sito nas Espadanas. O poço da Figueira já não chegava a meio caminho! Recorria-se então àquele do Barranco. Abobadado por nogueira secular, pertencente, ao que julgo, à família Achando, era agredável estar por ali, horas esquecidas, estirando à sombra,
enquanto na presa subia lentamente, o nível da água.
De vez em quando, passava alguém que metia conversa, ajudando assim a matar o tempo!As avezinhas faziam assento, nos ramos umbrosos da coposa nogueira, adormentando, pois, com seus trinados, quem estava ao redor.
E, enquanto ali, a dois metros apenas, gorgolejava a água fecundante, que iria dar vida às culturas ressequidas, passava eu também as horas a fio, cismando ou cantando, à sombra tutelar da velha nogueira
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6 - O Bairro da Laja
Vide-Entre-Vinhas é constituída por diversas partes, cada uma das quais, bem distinta das outras.
Assim: de modo nenhum se confunde a última com a da Portela;
igualmente a do Outeiro, em ordem à da Laja; o mesmo diria, qanto ao Beco e ao Terreiro, e às Cruzes das Almas .
Mas, se há sempre alguma coisa, a individualizá-las, aquela derradeira é a mais característica.
Se não, vejamos: é tradicional,vindo já isso, de tempos remotos, cear com dia, poupando assim a luz e o petróleo.
Acabada a ceia, caso o tempo não dê, por ser Inverno, põe-se logo termo às actividades, que terminam pronto, abeirando-se a noite.
Agora, o que resta é ir para a cama. Não há serão, por- quanto é da praxe utilizar somente a luz natural. Venha, pois, o bom tempo e eis o povo, dado à conversa, ao longo da rua.
Sentados em grupos, na berma do caninho, em bancos toscos, feitos de madeira ou até de pedra, quando não até, nos degraus do balcão ou no limiar das mesmas portas, dão-se agora as gentes a curiosas trocas, sobre o que vai, pela velha aldeia.
Nada ali falta de quanto se passsou, durante o dia.: as pequenas coisas bem como as grandes; escandalozinhos, bem apetecidos e farejados. Não são excluídas acções honrosas.
Assim vão as coisas, por terras da Beira. Há muito se fazia o que só tardiamente se viu nas cidades e vilas do País!
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7 - Bela Notícia
Vide-Entre-Vinhas, por diligências, na Câmara da vila, vai ter luz eléctrica, em futuro próximo. Com este objectivo, pediu-se o orçamento. Jamais se deparou, nos dias que vivi, uma coisa tão grata! O mesmo ocorreu, em todos os videnses.
Em boa verdade, não faz sentido que, vivendo os homens, no século das luzes, haja ainda uma aldeia, mergulhada nas trevas.
Como é triste e lamentável, quando não doloroso e incompreens«ivel! Os outros povos a verem , de noite: ali, ao invés, nem sequer de dia! O atraso, a ignorância, a rusticidade vêm de que esta aldeia jazeu sempre abandonada, ao longo dos séculos!
Somente alguém a lembrava, para exigir-lhe tributos! Quem foi o sem-vergonha a conceber tal ideia?! E como aceitar, de ânimo leve , um estado de coisas deste quilate?! Entidade com deveres, mas sem quaisquer direitos! Não é isto aberracção da
própria Natureza?!
Qual foi a cabeça que gerou tal doutrina?!
Está de parabéns a nossa Câmara, pois meteu ombros a esta empresa, deveras humanitária! Responsável do bem público, assume coajosa uma atitude que muito a enobrece! Ditosa seja ela pelo bem que lhe devemos!
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8 - Como em fim de período, também se cloloca um ponto final.
Termina o giro, atinente a Fevereiro, para início doutro, referente a Março. Um mês que se perfaz.... uma volta mais , já executada, no ciclo da vida!
Lançando agora um olhhar retrospectivo, noto angustiado que a obra realizada é algo incolor, insignificante e de pouco interesse!
Apenas vivo as aulas que amo com paixão, tendo sempre em mira a boa preparação, intelectual e moral dos alunos confiados.
A isto, na verdade, tenho eu sacrificado energias e tempo.
É, indubitavelmete, um dos grandes prazeres que disfruto, neste mundo!
Quanto ao mais, estou convicto de que não sou, realmente, o que desejava, mas ao contrário, o que outros pretenderam, embora erradamente!
Que me importa a mim que se tenham enganado?! Por mim, afinal, tenho eu de responder e mais ninguém! Por esta razão, é que devo ficar no que bem me pareça!
Efectivamente, não sinto remorsos, por não haver sido quanto me disseram.!
Quem podia saber o que me agradava e trazia conforto?!
Trataram,afinal, de violemtar-me, forçando a natureza, ainda sem forma e levando-me logo a tomar resoluções que hoje não aprovo,
por elas destoarem de quanto eu prezo e a que simto inclinado todo o meuser
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9 - Chegaram as Andorinhas.
Começara, havia pouco, as aulas da tarde, que tomam seu início, às 14. e 30. A gente lamentava-se: " Que tempo este!"Eis senão quando à maneira duma flecha, corta o céu, pela direita, uma andorinha veloz! Eram acrobacias de mestre consagrado! Voos a pique...voltas e desvios, sempre inesperados, dando a impressão de haver concorrência!
Não me enganava! Folguei de as ver! Creio ser antes mostra inequívoca de saudade e alegria o que eu lhes vi fazer. Peitos anelantes, asas encurvadas, vozes alacres!
Benvindas sejais, meigas andorinhas do meu Portugal! Eu vos saúdo, bem cordialmente! Não vindes trazer-me a nova
graciosa da linda Primavera?! Quanto eu folgo, de ver-vos e mais
de escutar-vos!
Entendo, à maravilha, o vosso linguajar! Compreendo e justifico a vossa alegria, deleitando-me em extremo essa ventura que já vos inunda!
Anunciais vós que a vida recomeça e o amor se renova, cada ano que passa. Vindes pressurosas construir o doce lar, à terra de vossos pais, onde vistes a luz, pela primeira vez!
Feliccitações, por escolherdes o meu Portugal, o lindo céu azul, que nos cobre a todos!
Entretanto, apodais-me de ingénuo, ao dizer bem alto:" O doce lar é o encanto da vida!"
Leio em vós próprias a condenação do meu viver solitário!
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10 - Desigualdades
Ele beijou-a e fez-lhe carícias, enquanto ao lado se abriam gulosos, olhos famintos, que não achavam resposta às suas perguntas.
Os petizes, em geral, constituem para nós grata revelação: cá neste mundo, já pode haver céu! Não o mostram, com efeito, na pura limpidez de seu terno olhar?! Na imensa doçura de suas falas meigas e tão carinhosas?!No sorriso etéreo que se evola de seus lábios?! Pois que dizer da sua ingenuidade que assaz nos encanta?!
Que mais nada houvesse, neste mundo cruel senão as criancinhas, já valia a pena a angústia de nascer, para saborear a
maravilha inefável de tão belo quadro! Algo haverá delas que não seja delícia?!
A impotência que as apouca, a inocência que as impõe, a
ignorância que as sujeita e faz dependentes, a fala e as maneiras que as tornam brinquedos!
Quem não gosta de crianças?! Somemte aquele em cujo peito não bate o coração! Somente aquele que já perdeu no vício
delicadeza e honra ou que, desiludido por negras traições, endureceu qual granito a que nada impressiona!
Entretanto, porque muito as amo, evito geralmente distinguir esta, menosprezando aquela! Não me julgo no direito de levar a tristeza ao peito inocente duma criancinha!
Mais vale, penso eu, não prestar alguma vez as provas habituais de cortesia e carinho, para não magoar as que, lado se encontram. de olhos inquiridores, não achando resposta que bem as satisfaça!
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11 - O Chão
-- Ó Ana?
-- Quê, Antonho?
-- Pas que vou até ò Chão!
-- Olha, vai quer não!
Neste diálogo,tantas vezes repetido. eram protagonistas dois bons vizinhos, muito amigos de meus pais.. Por não terem filhos, ocupava eu, decerto. um lugar especiai, no seu coração.
Quem me procurasse era junto da ti Ana ou do ti Cândido.
Por tal razão, acompanhava-os, às vezes, deslocando-me às leiras, que me eram familiares. De todas elas guardo, afinal. suave e grata memória, evidenciando-se o Chão dos Bacelos. por ficar mais perto.
Em nossos dias, todo ele é cultivado, mas naquele tempo, quero dizer, há 40 e tal anos, apenas uma leira gozava realmente dessa prerrogativa, por ela se encontrar, juntinho ao valado.
Havia lá uma cabana, muito rudimentar, constante somente de paus ao alto, em forma de triângulo, sendo estes recobertos de giestas e palha. Como então apreciava abrigar-me ali, fugindo à chuva bem como ao vento!Estendido, a capricho no rés do chão
em que havia muita palha, afigurava-se então a melhor das vivendas!
Além da cabana, vários outrps motivos de grande interesse possuía o Chão.
A meus olhos inocentes fazia negaças o fundo valado, cheiinho a transbordar; as maçãs rechonchudas e tão vermelhinhas, que sorriam, no alto; as uvas douradas, pendentes das videiras; os cortiços das abelhas; as cerejeiras bem como as figueiras.
Lá bem ao cimo, era o Chãozinho.
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12 - O Zé Miguel
Onze de Outubro de 1933!
Meu pai acompanhara-me, à Estação Ferroviária de Celorico da Beira., aonde eu nunca tinha ido, para tomar o comboio que havia de levar.me ao Seminário, sito no Fundão.
Duas coisas singulares me chamarama atenção, na dita paragem do caminho de ferro. Já lá vão, com certeza, 34 anos .Como o tempo foge!
Transpondo a via-férrea, depara-se em frente, um pequeno jardim, no centro do qual se mostrava airosa a bela estatueta duma
criamcinha. Até aqui, nada surpreende!
Olhando bem, noto o seguinte: o meúdo, em pé vertia o líquido por onde outros mais o não faziam! Ora, isto para mim, que não saíra da aldeia, foi algo interessante e assaz divertido!
O segundo facto, que vem mais a propósito, respeita ao Zé Miguel. Ao entrar no comboio, avisto de pronto buliçosos rapazinhos, que vestiam de preto, o que logo fez saber-me que eram seminaristas!
Entre eles, porém, achava-se um cujas maneiras e rosto característico, me davam que pensar! Era, na verdade, o rapaz mais feio que havia encontrado! Olhos desmedidos, nariz descomunal e boca rasgada que, por bem pouco. não tocava nas orelhas!
Juntando a isto um corpo mal feito e modos ingénuos, que deixavam ler o que passava na alma, teremos pequena amostra do nosso Zé Miguel!
Mas ele, a rigor, nãõ era bem isto!
Era quase um anjo, como soube depois.
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13 - Duas Pombas
Curiosa, na verdade, a história destas aves! Vale a pena recordá-la , pois traz à memória um grande e bom amigo dos tempos do Fundão - o Manuel Pedro Simões.
Não sei a que proposito, vim um dia a saber que tinha um pombal, em Aldeia de Carvalho.
Ora, acontecia que eu, nessa data, andava interessado, no assunto em questão. Já fizera diligências, em tal sentido, embora sem fruto!
Quantas vezes eu não fora às Quintas do Salgueiro, na mira dum pombal?!
Infelizmente, porém, nada consegui, porquanto a s doninhas chupavam-lhes o sangue, morrendo em seguida. sucedeu o facto, no meu Carvalhal,, com grande emoção e funda revolta!
Quando o Pedro Simões me falou no caso, fiquei desde logo como árida terra suspirando por chuva!
Transmiti-lhe, a propósito, as minhas spirações, prontificando.se logo a oferecer-me um casal. Quão grato lhe fiquei!
Suspirava ardentemente pelo dia da entrega,, em que um belo cabazinho encerraria, decerto o meu rico tesouro
Ap+os mil cuidados, cheguei a Vide-Entre-Vinhas mas desta vez posterguei o Carvalhal. Asdoninhas, ali eram o Diabo!
Resolvi, pois. fixar bem alto, na casa de meus pais, um pombal de madeira,, com duas entradas.
Esta ideia sorria-me e todo me enlevava. Quantos projectos que en tão não fiz! Quantas cenas ingénuas, douradas, a primor, pela fantasia!
Eram brancas de neve as duas pombinhas e lá do alto beiral, julgo me saudavam, logo pela manhã!
Escada acima, vigiava solícito a postura dos ovos, mas descendência é que nunca houve Que tristeza a minha!Eram duas pombas!!!
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14 - A ti Tomásia do Terreiro.
Esta velhinha morava, se bem me lembro, a poente da Igreja e pertinho dela. aaaaaaaaaaaaenviuvara, bastante cedo, portando-se bem.
Nos últimos anos, o passa-tempo querido eram os netinhos,
porquanto nada mais podia fazer que prestar-lhes assistência.
De trato muito lhano, a todos encantava, pela bondade e ternura do seu coração! Os filhos e os netos formavam o seu mundo e, quando falava neles, sobretudo os ausentes, fazia-o sempre de lágrimas nos olhos!
O filho Mateus constituía a sua glória!
Então, to Tomásia, os seus filhos escrevem?
-- Olhe: o Mateus escreveu agora e mandou-me logo 5o dólares!Coitadinho!
-- Enquanto falava, corriam-lhe as lágrimas a 4 e 4! Para
querer bem ao filho Mateus, bastava escutar a mãe extremosa.
O seu Francisco morrera afogado, bem perto de Lisboa..
Grande, por certo, foi a sua dor, pel infausto sucesso!
Um belo dia, passei por ela,, ao cimo do Terreiro e notei pronto que andava esmorecida.
-- Deus a ajude, ti Tomásia
-- Venha com Deus, volveu ela eprssurosa, esforçando-se ao máximp por ser gentil. Se não me engano,anda um pouco doente!
-- Olhe: foi um tombo que dei ali na horta! Fiquei escarxanetada e não me posso mexer!
Esta figura amável era já parte do nosso Terreiro. Quando ali passo, tento ainda enxergã-la,mas sepre em vão!
Partiu para sempre! No entsnto, o seu vulto amável perdura ainda, vindo risonho ao meu encontro.
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15 - Etelvina
Companheira de anos e parceira de folgares, quando adolescente, é hoje Doroteia. Há muito que a não vejo. parecendo-me de facto não ter já presente a sua fisionomia. O que harto me afectava era ser filha única e deixar seus pais, já um tanto velhinhos, sem ningué mais, para os amparar!
Deus merece tudo, bem entend9do, mas não ignoro também que- nos obriga a velar por quem nos deu o ser e, com tanto amor,
nos criou e socorreu, logo em criança. Não diz, a propósito o 4º
Mandamento: " Honrar pai e mãe?!"
Lembro ainda bem que, entre as nossas diversões, figurava logo a Missa dominical e outros actos sagrados, que nós imitávamos, bem compenetrados! Por modo geral, oficiava o Tonho, que frequentou, muito ao de leve, o Seminário Menor, sito no Fundão.
Deus o tenha em descanso!
Assistíamos todos, com enorme devoção e muita compostura, servindo-nos, aos santos, de uma campainha, tirada ao rebanho.
As nossas mães eram todas piedosas e muito amiúde se viam na igreja. Aquilo que se fazia era imitação do que víamos no templo. Por outro lado, em nossa casa, falavam-nos muito de altas digidades e funções sagradas, que a nós se apresentavam como próprias dos Anjos!
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16 - Os dois Rainhos
António e Manuel eram dois irmãos assaz activos, pertencentes ambos à família Rainho. Conservo deles grata recordação, por serem habituais, nos trabalhos de meu pai.
Confiava plenamente nos dois jornaleiros.Deixava-os sozinhos, dias inteiros, e o trabalho fazia-se, a tempo e horas
Muito dinheiro ganharam os dois, em terras de lavra!
Em abono da verdade. é forçoso dizer que foi sempre merecido! Quantas vezes segradavam, em tom convicto: Hoje que não está o patrão, vamos fazer ainda muito mais!
E sempre tumba... tumba, viravam eles jeiras de terra ou
faziam sementeiras! Dava imenso gosto vê-los trabalhar, continuamente.! Dois rapazes caprichosos, bons e leais!
Não que o velho pai, em questão de lealdade, era muito rigoroso! Ai de algum filho que o não respeitasse, deixando de cumprir o que ele mandava!
Glória lhe seja dada que todos os filhos honraram, a fundo, a sua memória!
Ainda hoje os olho com grande afecto e muito carinho, figurando-os harto fatigados , em largas sementeiras longas
colheitas, sempre muito lestos... insatisfeitos!
O seu lema era este .:"Sempre mais e melhor!"
E quando o patrão, declinando o Sol, vinha observar o que estava feito, murmurava, com gosto " Ai o demorgue! Hoje chegaram-lhe!"
A estas palavras, encham-se logo de grande ufania e satisfação, esquecendo breve trabalhos e penas que o dia trouxera!
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17 - José Gonçalves
Volvidos agora uns 4o anos, embora estejas há muito na Pátria Celeste, venho rogar me perdoes benigno, pois te ofendi, nos tempos de criança.
Eras tu já velhinho, e eu botão de rosa,, que abria para a vida. Sol poente e Sol nascente: um que tocava no fim; outro que chegava!
Lembra-te ainda o petiz incente que já te arremedava, abrindo a boca?! Subias cansado a rua da Portela, junto da travessa ( Rua da Oliveira),quando te avistei, pela primeira vez.
Tronco derreado e pernas já trôpegas, o suor a correr-te pela fronte inundada, e o peito arquejante, fui ao teu encontro, mofando de teus anos, sem clemência nenhuma , pelas tuas cãs nem sombra de piedade, pelo teu cansaço!
Vejo-te ainda a subir, a loga distância,, e o meu coração estremece no peito!
Quanto eu adoro os pobres velhinhos e sinto bem fundo seus graves problemas! Posso eu ignorar seus altos queixumes?!
Diz-me, pois, se ficaste magoado ou se a dor te feriu de tal maneira, que sofres ainsa!.Eu era inocente e não tinha malícia. mas se pequei, aqui estou repeso, implorando teu perdão!
!Velha Rua da Portela, que és a mesma ainda, rectificada embora, ficaste horrorizada com o meu proceder?! Casinhas modestas, que observastes,sisudas, a cena infantil, que ainda agora me oprime, que foi que dissestes, de minhas diabruras ?!
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18 - A Figueira da Horta
"Figueira branca", no linguajar dos nossos aldeões!
Ainda muito cedo, já torturava a fundo o olhar dos catraios, por causa dos figos, temporões e lambazes, que eles miravam, do camunho irregular, com olhos cobiçosos. Para chegar-lhes com a própria mão, apetecia correr, sobre a água do tanque, à maneira de S.Pedro, quando no Mar se aoroximava de Jesus.
Mas que ideia triste-murmurava o Amadeu- estender estes ramos. sobre o tanque do ribeiro! Só por acinte!
Em mim, porém, não fazia ele mossa, que tinha licença da ti Ana e do ti Cândido, para entrar pela horta. Mas o espelho das águas criava macaquinhos , no meu sótão fantasista! Se acaso alguma vez ia parar lá abaixo?! E que medo eu tinha da enorme extensão de água tranquíla, em que os raios do Sol iam já reflectir-se, bastante debilmente, coados ali pela densa folhagem!
Nisto, valia-me o ti Cândido, Ao notar a indecisão e mais ainda o enorme receio, que me tomava prestes, pegava do sacho e... zás!
Puxava um ramo que logo obedecia, ofertando generoso os figos cobiçados! Os belos figos lampos!
E toca de comer e vá de saborear, tendo os meus olhitos presos e fixos na boa da figueira!
-- Queres mais, Pedro, sondava prazenteiro.
Ao aceno imediato, repetia a operação, contorcendo mais um ramo
Quem diria então, ó rica figueira, que na sua velhice, provocarias a morte do bondoso velhinho?!
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19 - O Rapa.
Durante algum tempo, foi este jogo forte paixão1 Até
sonhava com ele! O demónio do pião, com faces lisas e endiabradas, em que se viam claro as iniciais do Rapa - tira, deixa e póe - fazia andar.me a cabeça em grande rodagem!
Os primeiros passos foram infelizes, porque lidava então com rapazes mais velhos. nem sempre leais. Por se tratar dum jogo, em que, realmente, não valem habilidades nem a mesma experiência, aguarda-se, meramente, a acção do azar!
Nestas circunstâncias, quando eles ganhavam, tinha de prosseguir, quisesse ou não.
Bafejava-me a sorte, eram eles então que desligavam, à primeira jogada que me fosse vantajosa. Mercê deste facto, cheguei à conclusão de que não era jogo que me conviesse. Quando me entregava a estas diversões, gostava de ganhar, luzidamente!
Apesar de tudo. aquele piãozito, insignificante, dava tratos de polé à minha fantasia, para descobrir qual seria a maneira de o fazer girar, em proveito meu.
Após alguns inêxitos, abandonei para sempre o grupo dos mais velhos, fazendo experiências com os do meu tempo. Assim,
realmente, já não corriam tão mal os assuntos pessoais, deixando-me sonhar, em alta delícia, com um porvir, muito mais risonho!
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2o - Mondeguinho
Havia muito já, que não te visitava, pelo que folguei, de chegar-me a ti, embora em andamento, com breve pausa.Não previ, no entanto, o cenário lastimoso que irias oferecer-me!. Tudo, naquela hora, gemia horrorizado, no interior do meu peito!
Julgava eu me acolhias prazenteiro, como sucedera, em dias calmosos,quando eu me deleitava, ao murmúrio suave de tua linfa pura e gorgolejante. Que foi, então, o que sucedeu, na tua débil nascente, para deixares de animá-la, com sentidas endechas, na Serra da Estrela?!
Mondeguinho, meu amigo, quem te veio pôr lágrimas, como realmente, nunca vi chorar?! Não temas nem julgues que eu seja indiscreto! Nunca fui desleal a um bom amigo!
Estes meus olhos viram consternados os sinais inequívocos
duma grande e viva dor! Eram como pingentes, dispondo-se todos
ao longo de face, já cadavérica! Não sei agora como vou lembrar o hórrido momento, em que senti a vida já esmorecendo, neste meu peito!
Que houve, pois, no teu viver, para não sorrires, à maneira de outrora?! Deixaste, por ventura, de ser meu amigo?! Não posso
admiti-lo! Bem me parecia que a tua velha fonte eram lágrimas reais, cumprindo assim um tragico destino! Não posso esquecer-te!
Agora que já me assenhoreei da tua desventura, mais te quero ainda, mais sofro por ti! Nem as avezinhas, embalando amorosas teu rústico berço nem sequer verdura, para alindar a tua
nascente!
Bem ao contrário, tudo seco e mudo... e, à tua roda , outras lágrimas vi, reflexo, talvez de uma grande simpatia! Nunca vira assim lágrimas, geladas e agudas, como essas tuas, sobra a face inerte !
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21 - O jogo da chona
A seguir à péla, era este jogo o que nais estonteava a minha cabeça! Nas primeiras jogadas, fui muito infeliz, pois tive de parceiros rapazes crescidos e com experiência.
A breve trecho, porém, o cenário mudou, pois me associei aos jovens a minha idade.
Para cada lado, podia ser um ou mais ainda. Sendo múmero ímpar, havia emtão recurso: um do grupo fazia duas mãos.
Geralmente, porém, fugia-se a tal meio, por ser arriscado, nalgumas ocasíões.
Um tosco pau de 60 centímetros e outro de 15, aguçado a primor, nas duas extremidades, eis o necessário, para o jogo da chona.
O primeiro problema que logo surgia era a escolha do lugar; em seguida, o equilíbrio dos parceiros, de tal maneira que não ficassem os melhores jogadores apenas de um lado. Por esta razão, os dois mais peritos é que atinavam, segundo o que segue:
-- Que pedes? Bicos ou champlas?
Ouvida a resposta,subia o pau no ar, aguardando-se a maneira como ele caía, ao tocar no solo. Àquele que acertava cabia o privlégio de iniciar o jogo.Ao adversário assisttia-lhe o direito de escolher o parceiro, em primeiro lugar. Assim continuava, escolhendo-se os restantes, alternadamente.
Arrumada já esta parte inicial, fazia-se a ola: razoável circunferência, no chão direito, marcando-se depois o lugar exacto,donde a chona seria atirada à ola em causa.
Se ficava dentro, invertiam-se os papéis, já que o parceiro
contrário ficava morto, Ajustava-se também o número de calhas e
o preço do jogo.
A chona era sem dúvida o pau mais curto; a chamada calha era fornada por 5o pontos
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22 - O Jogo da Péla
De todos os jogos da minha adolescência, foi este, sem dúvida o que mais penetrou no meu coração. Ele
evoca, ao mesmo tempo, duas realidades: a minha psicologia, com vista ao dinheiro e, de igual passo, o meu fundo amoroso.
São os dados basilarres da minha alma ardente.
Por mais voltas que desse ou me fizessem dar, nada as apagou!
Houve, provavelmente, aparências de morte ou melhor ainda "estagnação". Era lume vivo que se ocultava, debaixo da cinza - fogo latente!
As qualidades ou os mesmos defeitos que figuram dominantes, não há força nenhuma que possa destruí-los, inteiramente. Após a "hibernação"que o artificialismo chegou a
provocar, reerguem-se fortes, com mais virulência, tentando a desforra.!
O papel da educação, em casos desta ordem, é dar às energias nova orientação: matar essas forças é inpossível!
Criar-lhes, pois, um campo de acção, em que elas se apliquem,
eis o segredo! Além disso, é preciso também que o jovem educando esteja ciente, colaborando, de boa vontade.
Amor à família... amor ao dinheiro... e tudo jogar por estas realidades! Ora, como a péla me trazia bons escudos, era meio adequado à minha educação. Jogava um dia inteiro, sem interrupção, cono era habituamente o 3 de Maio
Escolhia os parceiros a quem eu sozinho pudesse ganhar um magro escudo, fazendo as duas mãos ( jogava sozinho contra dois parceiros)-
Tendo eu receio de que viessem a negar-se, a meio do jogo,
por estarem a perder, aceitava eu o dinheiro em csusa, logo de entrada.
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23 - Natação (no Barreiro)
O Tonho Ferreiro e o Joaquim Martins eram dois amigos, que me viam amiúde, quando visitava minha avó Udabel. Entrevada e ceguinha, no final da vida, muito se alegrava, quando ia ter com ela.
No bairro extremo da aldeia, olhando a Poente, criei desde logo,
novas amizades, entre a gente nova. Nela se enquadrsvsm os
citados jovens.
As novas relações originaram passeios e vários passatempos!
Um belo dia, convidaram-me eles para ir ao Barrero,em sua companhia.. Havia lá uma presa, encanto e fascínio dos adolescentes que tomavam banho.
Era no Verão. A ideia sorriu-me e aceitei pronto, embora com reservas, pois em vida minha, nunca entrara na água., ao menos em poças!
Eles então reduziram a pó todos os receios,, dando tal cor ao facto, que logo me empolgou.~
De atalho em atalho, galgando propriedades, eis-nps já em frente duma presa cfeiinha!
Foi um momento! o tirar os meis olhos da água esfriada, já estavam desnudados, convidando-me a segui-los.
Hesitei una vez mais, acabando por ceder. Mergulharam três vezes, mas eu, receoso, não estava ainda pelos ajustes!
Abeirava-me da presa, sondava a temperatura, com as mãos no líquido, recuando por fim, bastante amedrontado, visto que era um tanto fundo!
Estímulo dum lado e apoio do outro, reslvo lançar.me
Impossível! Re solvera desistir!
Eis senão quando violento empurrão me atira para dentro,, afogando assin qualquer temor!
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24 - O ti Cândido
Quem o procurasse, no retorno a casa, veria quase sempre um homem atarefado, de sacho na direita e olho
alerta! Não... que era fina força arrebanhar, com a pá, todo o excremento de pesados ruminantes!
Assim, pois, neste fétido labor, jamais lhe escapavam os tais
dejectos, por mais disfarçados que estivessem no chão!
O que eu, porém, mais admirava não era isso! Quantas vezes, dei
tratos de polé à pobre fantasia, para assim descobrir e logo justificar os milagres de equilíbrio por ele realizados!
Como é que podia o saudoso vizinho, que já não era rapaz,
sobrepor e ajeitar, em superfície exígua, tamanhos poios de consistência variada?De muito vale, realmente, a experiência da vida!!
Muitas pesoas, estou em crer, nem com prática da vida, seriam capazes de fazer a mesma coisa que ti Tónio Cândido! Quando o peso ou a distância era já considerável, alternava os encargos, em ordem ao suporte, servindo a direita que alternava com a esquerda!
Lembra-me que, às vezes, o achado fumegava, detendo-me ali a fixar as espirais, brandas e lentas, que breve se dissipavam, no ar matinal!
Por vezes, cuspia na mão que se encontrava disponível, esfregando-a depois ao fato usado!
Agora, aproxima-se breve a entrada para a horta, onde havia couves, harto mimosas. Cá mesmo de fora, o bom do ti Cândido
elevava o sacho, de olho para cima, ouvindo-se log o som onomatopaico: Claque!
A cada pazada, o monte subia e, juntamente, crescia o fétido.
Às couves, porém, sorria-lhes o jeito!
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25 - Duzentos mil!...
Numa aula de Latim, segundo ano, em 1934,
estava o nosso Prazeres dando a lição. Depois de haver lido,
traduzia o texto.
Muito lampeiro, julgava na sua que fazia figura! Por isso,
lança-se com alma, na faina inglória! Bom é dizer que pouco ligava ao espírito da letra! Era, sin, escravo dela!
Ora, trata-se, realmente, dum trecho histórico, que era alusivo às Guerras Pérsicas. Falava em Temístocles e, se bem me lembro, do auxílio prestado por algumas cidades.
Nisto, o Prazeres continua lesto:"...enviaram-lhe serpentes.
navios e, finalmente, 200.ooo traques
Oh palavra que disseste! Irrompe, desde logo, uma tempestade de riso e de lágrimas! Ningém ouve ali, por mais composto, que se aguentasse!
O professor Barata deixou cair os óculos que logo voaram, da mesa para o chão! A classe do 2º jamais presenciara uma cena tão cómica! Isto , devido às circunstâncias e a tudo o mais que veio, em seguida.
Realmente, o caso não ficara arrumado!
O nosso Prazeres ameaça o professor com o dicionário. Penando ter razão, falava até com certo arreganho.
Vira no texto a palavra "pedtum,i", mas escapou-lhe que
pedes, peditis faz também "peditum", no genitivo do plural.
O remate foi dado por algém, nas filas de trás:"Então, não
admira que ganhasse a batalha!"
26 - Um Carneiro Zeloso
Os zelos, ao que vejo, não são exclusivos da pessoa humana, que também os animais os sentem e vivem! É o caso lastimoso dum valente carneiro que, tempos atrás, fazia também parte do noso rebanho! Maior e mais possante que as ovelhas todas, parecia orgulhar-se dos seus privilégios. Passeava altivo, à maneira de sultão,npharém cobiçado.
Ali, era tudo: quem mandava e dispunha, governava e corrigia. ao mesmo tem+p, ia também gozandp a vida!
Terceiros ali é que não consentia. Ai do infeliz que se abeirasse das fêmeas! Madiria, por certo, o comprimento. no chão!
Minha irmã, Agusta tinha então 12 anos.
Como fora à do Pinheiro levar comida ao pastor Alcides, de-se então ao luxo de passear os olhos , por todaa fazenda e observar
os cordeirinhos que eram, nessa altura, o encanto das genttes.
O soba, porém, é que não foi nisso!
Veificando. à primeira, que tirava bom partido, começa a recuar,
para seguir em frente, com fúria louca!
Ao ímpeto forte e fulminante, ela cai,estatelada, vítima das hastes do terrível animal!
Assim que se levanta, repete-se logo o furor incontido.
Várias vezes cai no chão, ficando-lhe o corpo cheio de contusões
Ciúme dum llad; inexperiência do outro!
Quem se deita no solo já não tem que recear!, Ela, poré, leventava-se prestes, o que motivava uma série de quedas, ininterruptas.
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27 - A Ladeira
Girava, há muito, na minha cabeça, uma ideia
obsidiante!Impossível resistirºlhe!
Não ficava, afinal, essa estéril propriedade muito distante de Vide-Entre-Vinas?! Nunca lá fora,mas iria chegar o dia suspirado!
É certo que, à data, me parecia inatingível, pois seria necessário fazer primeiro longa caminhada, com subisas e descidas, violentgtsd demais, para a minha idade!
Sabia, n entanto, que havia lá figos, o que assaz contribuía, para avivar-me o desejo! Se eu olhava deslumbrado o estreiti caminho, que se oferecia â vista cobiçosa!
Quanto eu gostaria de trilhã-lo uma vez, seguindo o curvejar das mansas cabrinhas que a ti Ana guardava!
Embora cá de longe, distinguia claro sua voz diamantina,
reboando sonora , de quebrD em quebrada: !Eh Nogueira! Ó alma do Diego!"
Esta voz sonora não saá dos ouvidos! Em casa ou na rua,
acordado ou não era aquilo un sortilégio. às vezes,obscessivo,
Ó ti Ana, deixe-me ir consigo até â Ladeira! Deixa?
-- Quê, mê filho? É muito longe! Não aguentas o caminho!
-- Aih,gostava tanto de lá ir!
O dia, porém, sempre chegou! Por bela anhã dum Abril imaculado, partimos juntinhos, ela mais eu. Ia também a Laranja,
o Rouxinol e a Negra, sem faltar a Nogueira.
Que meigas cabbrinhas! Já sabiam o caminho, de cor e salteado!
Chegadas à Laja, cortaram à esquerda, sem ninguém lho dizer! Fiquei surpreendido! Sabiam mais do que eu, embora racional!
Agora, vem a Quinta; depois, os Moinhos.Seguem os Codessais e, lá na extremidade, muito para além, a cobiçada Ladeira, pequena e dourada!
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28 - O Lameiro
Exígua propriedade, sita nas Espadanas. Sendo cavada, leva 4 homens.
Terra de lameiro, donde lhe vem o nome, foi herança materna, e encontra-se ainda em seus descendentes. É mimosa w fértil, perdendo um pouco, de não ter água, julgada bastante, para a rega das culturas,
Este caso aflitivo motivou, frequentes vezes, a guarda do poço, ao longo de 8 dias. O que faz tal miste +e, segundo uso antigo, velho ou criança, pois não raz cuidados nem exige, por certo, dispêndio de energias,
Consiste em velar, bem junto da presa, não saindo jamais d o seu arredor.
A refeição élevada ao síto, onde avulta já uma facha de palha,com
mantas por cima. Noites e dias consomem-se ali, numa lenta ociosidade.
Se algu´wm passa acaso, há longo cavacom mas algumas vezes reduz-se para logo a simples monólogo monólogo, harto praguejado, quando outrem, invejoso, de vista retorcida, e tova no aspecto, fica mal humorado! Atão isto nunca mais acaba?!
Outras vezesm é um condiscípulo, amigo e leal que adrega de passar. em hora feliz. É de vê-los então, em grande euforia!
Já m fim, após os jogos fatigantes que distendem os músculos e
se escoam dum jacto!
Acontece tanbém que, alta madrugada, valendo-se do sono,
alguém abre a presa, a coberto das trevas!
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29 - O Carvalhal
Velha propriedade! Mosesto património! Quanto eu lhe queria!Cono estava apegado ao chão saudoso ! Foi, certamente, a primeira a conhecer e a que mais desamei, nos tempos de criança! Nos meses de Verão, era cárcere e tormento, para a minha infância!, exigente e buliçosa, pois não tinha ali ninguém. para jogos e folgares!
Em contraste, minha mãe, que adorava o silêncio e a paz da
Natureza, deleitava-se. em extremo, vivendo isolada, até porque dispunha de casa de campo, a meio caminho para outras proprie.dades. Mas fosse lá eu compreender razões e conveniências!
Apasar de tudo, o meu Carvalhai guarda, naverdade, o que há de mais santo, para o meu coração! Penso, a toda a hor que
dois vultos queridos se afanam como outrora, dobrados para a terra que lhes bebeu o suor e colheu as lágrimas!
E não devo enganar-me! A sua imagem vagueia sempre, a horas mortas, pelos batatais, ainda em flor ou pelas cercanias d a casa protectora, que albergava os gados e as fartas colheitas.
Creio que, noite velha, visitam este chão, que testemunhou fundas ansiedades e presenciou vários entusiasmos. Vigiarei assiduamente este sítio ameno e privilegiado, que foi teatro de labutas e canpo de ventura!
Logo que possa, irei ali morar, pois quero surpreendê-los, à hora do silêncio, mergulhando na treva, para matarem saudades infindas. Nunca mais houne novas! Partiram, há muito, rumo ao Paraíso e eu fiquei só, quase agonizante!
Velho Carvalhal, traz à minha vista esses grandes amigos!
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30 - No Carvalhal
Seja embora de longe, através da fantasia, enxergo batatais, horts viçosa, grsvanço e feijoeiros e tanro cebolal. Po r vezes, surpreende-me também viçoso meloal que
alastra seus ramos, por entre a fartura de mimosas batateiras, ainnda em flor..
Uma senda estreiinha, sorri em zugue-zagues,, desde a porta de casa,até à grande assentada.
As ditosas galinhas jamais tiveram, de lembranç minha, um Maio assim!
Que dizer dos pintainhos? Como eles se escapam à chama viva do Sol a pibo! A mãe.galinha é toda orgulho, pela farta ninhada que tirou duma vez!
Se não fora o milhano que chegou a iludi-la, por duas vezes,
estsra o grupo sem nenhum desfalque! Por isso, é ela toda olhos,
e, ao mínimo ruído, convida os pintainhos a tomar a fuga! É tudo
fulminante! A vida paraliza! Nem tugem nem mugem!
Novo sinal e ei-los outra vez felizes e contentes, correndo
azoratados atrás dos insectos..
as cerejeiras acenam lá de cima, com frutos vermelhos, enquanto se ergue altiva e deveras colossal, a meda de centeio, junto à casa
Depois, vem a malha à antiga, em que hão-de tomar parte 6 homens vigorosos.
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31 - Chamada urgente para o trabalho.
Se as tarefas do campo
entravam em premência,vinha dede logo ordem terminante: Pedro,vai chamar gente, para a carreja da lenha. Para mim, era ,isso um prazer! Ver-me livre das paredes, que tantas vezes fixana, de olhar embaciado!...Que podia, realmente, oferecer então à criança buliçosa que não tinha parceiros, para rir e folgar, distrair e brincar?!
Por isso, velozmente, corria porta fora, após haver escutado, em grande alvoroço, os nomes das pessoas que deviam trabalhar: Antónia Martins, Antónia Susana, Jesus da tia Cândida,
Conceição Prazeres e Etellvina Águeda.
Algumas delas já estavam apalavradas, mas sob condição.
Este simples facto levava a dizer sim. Evidentenente, preferiam o amo que melhor as tratasse.
O "ti Zaías" é que tinha destas!. Por ele, deixava-se alguém a quem tinham dito: " Não sei bem se poderei ir!" Ficava suspensa a causa em questão! Não havia compromisso, propriamente dito!
Por esta razão, bastava eu chegar, para que uma resposta, decisiva e clara, se fizesse ouvir: "Diz-le que sim!
32 - Às Pedras
Este lugar, dourado pela infância, fica situado na
Travessa da Oliveira., que é perpendicular à Rua da Portela. Juntinho da casa a que dava acesso, foi estância querida, onde passei, alheado, horas esquecidas, brincando e folgando.
"Vou para as Pedras! Venho das Pedras!", era de facto, a
resposta usual à pergunta materna: "Para onde vais? Donde é qie
vens?"
Deixe-me ir para as Pedras - rogo humilde, nem sempre atendido, que os lábios infantis tantas vezes formularam!
Um nada me absorvia :roupa estendida, para ali secar; mantas felpudas. em que grossas pulgas faziam haitualmente acrobacias diabólicas;; execuções em massa, nos insectos buliçosos; deixando a pele já bem agarrada a unhas de mulher; a largada dos bois, para o tabalho diário; o velho tear da vizinha Ana Rosa,cuja lançadeira parecia um diabrete; os velhotes da aldeia, subindo a calçada, em várias prestações....
Mais tarde já, viriam ter comigo outros jovens parceiros, a que eu me associava: o Tonho Ferreiro e o Joaquim Martu«insi ambos da Laja): o Tonho Carrapichana, o Manel e a Céu. estes três vinham ali, com mais frequência, pois o seu avô era meu tio e vizinho de casa
A vigilância, porém, era intensiva e. não raras vezes, bastante pesada. Por isso, no auge do passatempo, um vulto feminino assomava à janela, para chamar em seguida: Ó Pedro!...
Ai! que tortura! Largar os companheiros, ficando sozinho,
a olhar para os muros!
Apesar de tudo, aguarava apenas a segunda chamada, pondo-me a caminho, sem hesitação!
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33 - Fontes de Receita
Várias épocas do ano traziam consigo enorme prazer: o Carnaval, Páscoa e Natal; ceifa e malha do centeio; e tamém a Quaresma. Não que delirasse, pura e simplesmente, com os facts em si! O caso era outro!
A Páscoa do Senhor oferecia ocasião, para o queijo das rendas (pastos para gados) e com isso, exactamente, a ambicionada gorjeta que, por vezes, me davam, ao fazer a entrega.
O Carnaval ocasionava também entregas de outra ordem
( o Entrudo) que, por modo igual não era seco!; o Natal fazia-se acompanhar das suspiradas Janeiras, que vinham em seguida, e às quais se ligavam certos presentes, por vezes em dinheiro; ceifas e malhas traziam o lenticão, que eu logo separava, com todo o ardor e meticulosodade.
Entretanto, decorriam as coisas num ambiente de segredo e também de angústia: segredo, sim. para os pais não saberem que eu tinha dinheiro ( coisa proibida); angústia acompanhando, porque, a ser descoberto, ninguém me evitava um castigo em forma!
Apesar de tudo, preferia correr esses riscos todos, pois me dominava grande aspiração; ter algo no meu cofre!
Não era propriamente a ânsia de ser rico ou de extorquir o luzente numerário, por meios ilegítimos! Isso não! Era , sim, a vontade inquebrantável de juntar alguma coisa, fosse ainda à custa de enorme sacrifício e certas privações.
Também a Quaresma vinha logo em prol de meus altos projectos, Era o tempo favorável de piões e baraças Quanto esmero eu punha em torcê-las com rigor e como eu negociava, calculada mente!
Ó tempos felizes, por que fostes embora!
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34 - O Zé Martins
Já vai longe, muito longe esse tempo indesejável, em que o Zé Martins parecia um bicho mau! Que julgar, a seu respeito se, ao ver-me passar, em direcção à Laja,
me dizia sempre, com ar de zangado: "Ó Zabel!"
Ignorava, já se vê, o sentido das palavras mas, pelo forte arreganho que nelas punha, julgava então que não se tratava de coisa boa!
Mais tarde, porém, fiquei inteirado: minha avó paterna chamava-se Isabel. Acresce a isto que os tios paternos eram de facto António Isabel e Zé Isabel.
O que mais eu temia, na minha ingenuidade, era o ar façanhudo do Zé Martins, conhecido vulgarmente por Coixo Martins. Os ademanes, a sua postura, o avançar esboçado, o tom de voz e algo de papão, davam que pensar!. Tanto assim era, que só dificilmente conseguia minha mãe que eu fosse à Laja!
Quer se tratasse de mera visita quer dum recado ou mnissão urgente a desempenhar, era sempre grato ir a minha avo! Mas o Zé Martins?!
Não era ele porém, o único obstáculo!
Outros ainda pesavam sobre mim: a Senhora dos Anjinhos, passado o Terreiro;o forno comum, durante a noite; outro lugar
ainda que gozava de má fama...
Barreiras à ventura que jamais alcancei!
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35 - Os Passos
Efectuaram-se os Passos, na localidade. Este facto lutuoso lembra, afinal, a tragédia assombrosa do Hmem-Deus!
A ser verdade . não pode negar-se! - uma vez que se trata dum facto histórico, grande loucura foi a do bom Jesus, para oferecer-se a prova tão dura!
A propósito da morte, no madeiro da cruz, lembra-nos logo a sede excruciante que deve abrasar o infeliz crucificado, principalmente se perde muito sangue!
A agonia no Horto; as quedas frequentes, sob o madeiro; a flagelação; a coroação de agudos espinhos;, o cravar angustioso de mãos e pés e finalmente, a lançada cruel fizeram escoar o Cordeiro Imaculado.
Nestas circunstâncias, era de sentir uma ardência fortíssima, pois tal acontecia aos outros condenados. que se desentranhavan em palavras grosseiras e muito ofensivas.
Apesar de tudo, a boca de Jesus apenas se abriu, afim de perdoar:" Pai perdoai-lhes, que não sabem o que fazem!"
E quem pôde cravar suas mãos divinas , que tanto bem espalhavam, à volta de Si?!. Quem se atreveu a imobilizar uma língua tão santa, que proferia somente palavras de perdão?! Quem alanceou um coração tão bom, que se deu em holocausto, pelo bem da Homanidade?!
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36 - Ruídos
As Ciências Naturais chamam-lhes vulgarmente sons desagradáveis ao nosso ouvido.
Também a Música estará enquadrada nesta designação?
Em meu entander, julgo que assim é, vezes sem conto.
A verdade é que, embora se trate de sons harmónicos ou harmonizados, pode a execução não ser agradável. Isto é claro, por falta de gosto, insensibilidade, nenhuma preparação de ordem estética...
Em tais circunstâncias, verdadeiro caos de fugir, sem olhar!
Sucedeu ontem, por sinal adequado, com certa Filarmónica.
Foi pequeno, em verdade, o percurso andado. Apesar de tudo, quanto eu ansiei por que ele findasse, no mínimo de tempo!
Aquelas estridências penetraram tão fundo, que nem de noite vieram largar-me!
Tivesse o Inferno uma banda como esta, já era para mim a suprema desgraça!
Para que era o fogo, se ela, de facto, já me punha ao rubro,
sem mais acessórios que a falta de gosto?!
Música:" processo disfarçado, para alguém fazer barulho" como já se escreveu!
Bem parece que assim é pelo menos algumas vezes que eu reputo excepções!
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37 - Ano do Senhor - 1943!
Finalizara já o meu Curso Teológico, restando aguardar o Presbiterado. Como era Diácono, recebia convites de
párocos vizinhos, para ajudá-los em suas funções.
A vida sorria-me, sendo agradável o exercício das Ordens.
Também era grato prestar serviços. fosse a quem fosse. O peito
abundava em planos diversos, julgando, na minha, ser capaz de fazer o que outros, decerto. não haviam feito
Levaria assim, vantagem luzida a todos os malogrados, e já desiludidos. Mais tarde veria que não era bem assim!
Ora,sendo no Cadafaz a jornada eucarística, fui chamado pelo padre Tarrinha, afim de colaborar nos actos religiosos.
Aceitei com alegria, direi até, com entusiasmo. Estas jornadas viviam-se a fundo, em época de fé. O meu concelho - Celorico da Beira - ganhara justa fama.
Tudo corria bem, quando uma faísca deslumbrou todo o povo, devido, por certo, à intensidade com que brilhou, sinistramente. Quase ao mesmo tempo um trovão enorme, reboou velozmente, pondo medo e espanto nas gentes consternadas.
Quase tão vertginosa como a própria luz correu logo a notícia: três pessoas, na Rapa, caíram fulminadas. Apenas uma delas conseguiu levantar-se, ao fim de algumas horas.
Entre elas, quem diria, figurava o Zé Miguel, amigo sincero que perdi para sempre!.
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38 - Um Lar
" No lar, até a cinza fria aquece "
Não foi sem razão que Antero de Figueiredo escreveu tais
palavras.
A sua mesma experiência bem como a nossa dão tesemunho de que isso é verdade! Onde achamos o calor que ali se faz sentir?! Onde o carinho que lá nos acolhe?! Já vistes, por acaso, magia assim?! Frio que ele seja, envolve-o chama tal,´que tudo se mira, em seu clarão!
Falta lá pão? Escasseia a lenha? Mingua o conforto?
Não importa! O aconchego moral, o apoio de todos, a compreemsão, eis os factores que a tudo sobrelevam! Uma luz diáfana se faz sentir, derramando seus raios de alta magia, por todos os cantos da velha habitação!
A isto, afinal, nada aí há que posssa resistir!
As horas más, a incompreensão e a própria maldade, o tédio da vida e os cuidados da mesma não podem senão fugir, para muito longe, como diria o nosso Garrete. Dois olhos fulgurantes que são vida e amor! Dois braços vigorosos, que são fimeza, pão e conforto!
Jardim maravilohoso, onde vicejam mimosas flores, cujo perfume vai projectar-se na mesma eternidade! Quem ali se encontra é, por força, ditoso!
Também eu, felizmente, já experinentei o suave encanto dum lar amigo! Entretanto , aquilo que é bom não dura sempre!
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39 - As Cerejas do Pisão
Era o tempo das cavas, bela ocasião, em que as novas cerejas iam avermelhando!Tentação dos demónios a cor de pimenta, lá no alto da árvore! Os meus olhos inquietos, qual agulha magnética, rumavam, fatalmente, naquela direcção! Mas tão alta, sem galhos, como alcançar o suspirado fruto?!
Não pedia nem chorava,mas o centro de interesse e a minha
paixão encontravam.-se ali! E quando, por noite, regressava a casa, na grata companhia dos entes queridos, o meu olhar cismador ficava ainda preso aos mágicoa ramos, aguardando o momento, em que os doces frutos me ficassem à mão!
Durante a noire, sonhava com eles, não sendo raro surgirem diálogos, entre mim e eu mesmo. À vigilância materna é que nada escapava. Apercebendo-se ela do facto em causa, expunha o caso ao meu paizinho.
-- O nosso menino quer cerejas do Pisão! Fala muito nisso, durante o sono e, enquanto as não comer, nem dorme que lhe preste!
-- Ai o demorgue! Não estão maduras! Assim, fazem mal à pobre criança!
O meu sonho, porém, continuava deleitoso.
O certo é que eu à espera fiquei sempre! O garotio antes de elas sazonarem, trataram de pô-las em bom recado!
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40 - O Lar
Flores... crianças... avezinhas ... estrtelas!
De todas se evola suave perfume, que dulcifica a existência humana: as flores embriagam; as crianças enternecem; as avazinhas embalam; as estrelas suavizam. A medida, porém, é desigual.
As mais sedutoras são logo as crianças, porque dizem pai e ciciam mãe.
Oh! então sim, que a vida se transforma, não havendo na Terra mal-estar que resista!
Quem já sentiu as delícias ternas que o Lar oferece, pode imaginar o que será també, quando mais tarde formar o seu.
É um lugar de privilégio, onde se criam as flores mais belas:
tudo lá é doce, raro, magnífico. Azares da vida; fúrias incontidas,
bocados amargos, iras e dissabores, tudo se dissipa, com a aragem do lar!
Infeliz o homem a quem o fanatismo reduziu à triste sorte de não ter lar seu, quando a vocação foi incutida por alguém estranho!
Onde poisa a cabeça, quando surge a tempestade?!Onde o arco-íris que modifica, num pronto, o escuro da existência?! Onde os olhos meigos e as mãoss carinhosas que afagam cordial e sentimentalmente?! Onde quem sofra e se alegre conosc?! Onde achar, neste mundo, quem nos compreenda e vele por nós, a todo momento?!
Oh doce miragem, quanto me embriagas!
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41 - Se quiseres saber os defeitos de alguém, olha às qualidades que se atribui, ao falar!
Tenho para mim que é vaidade tola e grande estupidez propor-se alguém cono pessoaysenta, pois todos sabem que a vredade é outra! Em casos desres, é bem preferível que eu guarde silêncio, pois de outro modo. vou abrir caminho a verrinosos àpartes.
Não sei eu bem que os outros, em conjunto, vêem mais do que um só?! Ou pretendo, acaso ser eu mais esperto que os outrs juntos?!
Por que insisto e me deleito em frisar aspectos, para chamar as atenções?! Não é verdade que o meu proceder já se encontra registado nas crónicas diárias, em que se aquilata do meu viver exótico?!
De nada vale dizer: Não aguento o remorso de fazer tal coisa! Quem me ouve fica-se marimbando para as minhas palavras, enquanto vai dizendo, para os seus botões: "Bem te conheço!
És boa peça! Quem te não conheça que venha comprar-te! Vai espetá-la a outrem que n~so a mim ou então em linguagem trivial:
Já te vi-te, como dizia o amigo Mourão! Sinceramente declaro que fico enjoado, sempre que alguém, na minha presença, irrompe insistente em auto-elogio! É fazer de si grande patetinha, o que não me quadra, por modo nehum!
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42 - Quem me dera hoje recuar no tempo!
Gostaria de viver o que nunca vivi! Agora, é tarde em excesso, pois seo mão fora, pedia a dispensa. Ainda não assentei, definitivamente, no que hei-de fazer.
Criar meus filhos e educá-los, à beira dos 5o não pode encarar-se, de ânimo leve!É tarde para avô! Portanto, formasse eu um lar, não podia facilmente educar a descendência!
Ao meio século, falta disposição, vigor e pacência, no grupo familiar. Por outro lado, um lar sem filhos é um céu sem estrelas..... astro sem brilho... escrínio sem jóias! Ainda assim, convém, apesar de tudo!
Quem nos ampara, durante a velhice?! Alguém atenderá caturrices e enfados, que não podem evitar-se? Como há-de ser triste passar a velhice e os últimos dias, numa casa estranha, notando, à roda só gelo e tédio! Não se alumiar o negrume do fim,
num sorriso franco, urdido por nós! Não adormecer a dor alanceante no espinho agudo que amargura os nossos!
A insegurança bem como a tristeza, a vida e a morte, o presente e o futuro não afligem assim!
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43 - Em lugares diferentes do enorme Covão, onde fica Manteigas, avistam-se amiúde airosas capelinhas que a fé dos crentes ali ergueu e o firme bairrismo das gentes vindouras, umas
após outras, não deixou arruinar
É a Santo António como a S,Domingos, S, Sebastião e muitos outros. Alguns dentre eles, são homenagiados, com festa anual, em que Música e foguetes desempenham sempre relevante
papel.
Neste momento, ruma a procissão à capelinha de Santo António. Fica além do rio Zêzere. Assinalam agora que vai chegando o cortejo. Os ares atroam, repetindo-se o eco, de quebrada em quebrada,
De nada serviu a horrenda trovoada que, mesmo agora, se apresenta minaz! Efectivamente, há grande afluência de povo cristão e, o que é mais, consiste no seguinte: parece anoitecer.
Atmosfera de chumbo pesa sobre nós. Pressagia-se já o forte redobrar da grande tempestade, enquanto os relãmpagos,
frequentes e vivos se cruzam nos ares, para além da Serra.
Com o troar dos fortes morteiros. descargas eléctricas. algo temerosas, se dão nos ares, seguindo-se logo os ecos sonoros, que emprestam, realmente, um cunho de grandeza ao acto religioso.
Fogo da Terra e fogo do ar! Arte e céu como a Natureza fundem-se juntos, nesta homenagem! Tudo glorifica o grande taumaturgo que, sendo embora luso, é querido e amado, em todo o Universo!
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44 - Escrevi, há um mês, uma carta volumosa ao tio José. Vive em Rode Iland, nos Estados Unidos. Desejava imenso receber notícias, dele e dos seus, mas como por capricho, não sei de quê, há 15 anos já, que não recebo cartas, embora eu escreva, de vez em quando-
Não sei que mafarrico anda ali metido, para que as missivas não cheguem ao destino!É mesmo azar! Nem cartas enviadas nem recados recebdos nem nada,afinal!
Arre! É de perder a cabeça! Estou, uma vez mais, aguardando resposta à última escrita!
Se eles me convidassem a fazer uma visita, era só meia vez! Não me fazia rogado!
Um mês de férias, junto da família, em terras de maravilha!
Como seriam longos e assaz recheados estes simples Diários!
Variadas impressões... atraentes novidades! Os assuntos, sim,creio serem infindáveis! Escreveria, sobre mil coisas, algo diversas, não correndo perigo de escassearem motivos
Iria embrenhar-me, com ceta frequência, na grande cidade, a mair do nundo, com 13 milfões, examinando bem, com meus próprios olhos, maravilhas sem conto!Prodígios sem par!
Uma vez em Portugal, não obstante a grandezq e o fausto da América, ia com certeza sentir.me feliz, por ser esta, de facto, a minha Pátria.
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45 - Dois Amigos
Estou a vê-los ainda, lá no Carvalhal, embrulhando o cigarro, com franco à-vontade e grande mestria.
Eram momentos assaz deliciosos de convívio íntimo! Poderiam esqucer?!
A satisfação que lavrava no peito espelhava-se no rosto, por
forçosa simpatia. Também os olhos deles chispavam lume vivo, quando se cruzavam, à maneira de faíscas,, dum pólo ao outro.
Ó Isaías, que te parece aquela do nosso amerfricano, que ao fim de dois meses, já tinha esgotado as reservas ganhas , nos Estados Unidos?!
Ó Manuel Morgado, mas d eves lembrar-te de que a exploração das águas da mina, a construção dum prédio, ao jeito americano e outras coisas mais, não vão fazer-se, com inúteis bagatelas!
Bom. Tens muita razão naquilo que observas, no entanto, se pensarmos agora que o prédio em causa não passa duna cabana e que a água explorada não chega, afinal, para os pássaros beberem, no tempo do Verão havemos de concordar que o António Patrício não veio muito rico!
Eram neste molde as conversas jocosas de carácter satírico
entre o Isaías que me deu o ser, e o amigo Morgado.
Nunca havia tristeza, onde eles estivessem!
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46 - Melancolia é hoje o que reuna , dentro de mim"
É duro o seu reinado, porquanto me escraviza e nega direitos, ao passo que ela vai campeando, nos domínios da alma.
Precisava um coração, amigo e leal, que fosse, na verdade, irmão gémeo do meu e que, sendo generoso, aturasse as minhas birras. perdoasse extravagâncias, castigasse, de mão leve e acarinhasse também oportunamente.
Era, de facto algu+em que nºao posso dispensar, muito embora me dissessem que havia sérios obstáculos, no caminho a trilharfr:
O viço dos anos abateu e murchou e no lugar do sonho em que fora embalado, pungente realidade surgiu de chofre.
Sozinho e frustrado, calcorreando vazio as estradas solitárias deste mundo pecador, vou andando meu caminho, alquebradi já e de alento perdido.
Para onde me encaminho, Senhor dos infelizes?!
Para a morte, sim, a doce e bela amiga que liberta de cuidados?
Qual pobre sonâmbulo, de todos ignorado, vou deambulando, pelos caminhos da vida, sem achar-lhe interesse. Bem ao contrário, apresenta ela tais riscos e logros, que apenas um herói pode aguentá-la.
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47 - A Tirania
Desde que o homem surgiu neste mundo, perdido o equikíbrio que Deus lhe concedera, procurou ele, por fás e por nefas, sobrepor-se aos outros e logo dominá-los, ora pondo obstáculos ora destroçando
Baseados no facto que aponta a experiência criou o povo grego a palavra "tirania,", para designar o governo dum sõ.
Está mais que provado: o homempecador tende para o abuso
como a agulha magnética se inclina para o Norte. Se é bom, faz-se mau; caso seja mau, torna-se pior
Instigado pelis factos, o povo romano duplicava sempre as suas magistraruras afim de que uma parte vigiasse a outra.Daqui ressalta, pois, o inconveniente do partdo único.. Acabado o espião, começa o tirano.
Ora, num século de luz e mente democrática, não tem significado a velha tirania. Fica entre as coisas que mais ódio gera. Que direito assiste, seja a quem for, para fazer de alguém um rscravo seu? Aonde vau buscar as suas credenciais, para tão ignominiosa e infame tarefa?!
Que títulos invoca, para reger ou sustar todos os movimentos de quem nasceu livre?! Bem digno de maldição o que ousa andeusar-se, armado para os iguais em verdugo façanhudo?!
A lei poe que se rege o tirano dos povos são os planos macabros, tenebrosos projectos, ambição inconfessável, caprichos e loucura.
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48 - O novo dia aproxima-se já e, por esse motivo, a minha harpa desperta, entrando agora em forte vibração De facto, ouço pertinho melodiosos sons.
Q uem percute estas cordas que julgava arruinadas? Quem arranca desta harpa suspiros calorosos, que jaziam em potência? Que vozes são estas, murmurando segredos e deixando no ouvido
promessas e loucuras?
Vozes estranhas, calai-vos já, que não quero receber-vos!
Ide-vos embora, pois demasiado vos tenho acolhido, pelo que me encho de enorme pesar! As palavras,porém, não exprimem, a rigor, o que vai no peito! Este vive, realmente, sedento de carinhos e órfão de afectos! Quem sacia esta fonte que devora a minha alma?!
O clarão esperançoso, cada vez é mais forte e, dentro em breve, saudarei , pois. o astro promissor! Que venha para bem e não para mal, porquanto são já muitos os desaires que sofri!, durante a vida inteira!
Não quero prejudicar, seja ele quem for, mas anseio por mais luz, maior compreensão, objectivo concreto para os meus actos, apoio que socorra, abrigo que me ampare! É isso, afinal, o que vem a caminho? Sendo o caso assim, corra ele depressa, não suceda ainda abreviar-se a vida, antes que vivifique este ser debilitado!
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49 - Começo, outra vez, a andar inquietado.
Após uma vagem longa e morosa, que levou 3o meses, em
grande calmaria, vejo de novo o ar encapelar-se , correndo a barquinha risco de naufrãgio.. A verdade, porém, é que o novo andamento embriaga a minha alma e não posso resistir à corrente que me leva!
Vou agora após ela. coração a palpitar, alma em grande transe, as mãos trementes e delábios em prece!
Sinto o meu peito assaz confrangido, no meio da procela!
Gemidos e ais, suspiros fundos que lancei ao vento.: , tudo morreu.Isto que digo e o mais que não expresso, tudo morreu"
Já virá rompendo a aurora radiosa? Que é que vai tazer-me a nova situação? Mais desilisões? Mais ansiedade?1Valerá bem a pena dedicar-se a gente , a não sr a Deus?!
Poderei viver, cá neste mundo, sem nenhuma afeição, embora tão sensível, afeiçoado e carinhoso?!
Julguei-me sempre, na vida esgotada, uma contrafacção: não ertamente o homem que pareço!
Conseguira recalcar, durante algum tempo, o ardor incontido, que do peito se erguia. Vinha em rompante, sem nenhum controlo, parecendo louco! Excessos de zelo, mal orientado, realizaram em mim o que o sol abrasador efectua pronto em ceara jovem.
Cresta-se num ai, de maneira tal, que deixa a impressão de haver-lhe tirado o viço e a vida!
Entretanto, a cepa conserva-se húmida: novo rebentos dele vão surgindo: força nenhuma lhe ose ter mão. A vida recalcada
brota mais forte, mais sólida ainda
Quando, porém atentei na crua realidade, já estava ligado por fortes amarras|
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50 - Acabam de soar as 22 horas.
Também agora pus termo à lida habitual que, segundo o costume, entra pela noite. Não sei, de facto, por que é que lido tanto, se eu não tenho filhos! Caso os
tivesse, ia ser levado a certo exagero. Ainda assim, vou caindo nele, dispendendo, à farta, energias preciosas, que devia poupar.
Quem vai saborear o fruto delicioso de amargas canseiras... .resultado espremido a horas sem fim de trabalho insano?! Em
conclusão, beber o meu sangue, vertido gota a gota, no altar do sacrifício?!Vêm-me ciúmes, quando penso em tal, pois só a filhos
meus legaria, de bom grado, o que tanto vau custando!
Não fiz ainda o meu testamento e não quero morrer, sem
tê-lo em forma.
Na verdade, é meu desejo que os bens herdados fiquem na família, enquanto os auferidos sejam destinados a obras de caridade.
Nisto, realmente, vou já trabalhando, pois devo começar pelos meus sobrinhos. O Carlos Fonseca tem o 2º ano e a mana Glória está em vas disso.
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51 - Na Pousada airosa de S.Lourenço.
Afim de comemorarmos o grato aniversário da Missa Nova do Padre Tarrinha, todos nós, docentes, fomos brindados , com selecta refeição, na linda Pousada!
A própria tarde veio favorecer-nos, pois esteve excelente e
bastante acolhedora. Quem passou em Manteigas um Inverno inteiro saúda sempre, com muita alegria, o sorriso carinhoso de um dia soalheiro!
Olhando lá de cima o horizonte sem fim, numa tarde clareada, ficamos arroubados, ante o quadro soberbo da Mãe-Natureza! Vales cavados, até às profundezas... montões de neve,
espalhada a esmo; um número incontável de escarpas íngremes, em que seria perigoso fazer acrobacias!
À distância, rebrilhavam, na Estrela, as cúpulas do Radar, junto das quais se ergue a Torre.É ali, realmente, o ponto mais alto da Pátria Lusa (refiro-me ao Continente.!) Lugar maravilhoso, onde se medita e sente, por força.
O Castelo da Guarda acenou, de longe, fazendo reportar, nos à época longínqua , em que a valentia bem como o heroísmo
seguiam a par. Viriato e seus homens andavam por cá, misturados
por certo, com a luz da paisagem, imersos também na mesma neblina que a todos envolvia!
Vinha, por força, o desejo ardente de ficar por aí, absorvendo a plenos, haustos o ar puro da montanha
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52 - O beijar do Menino.
Na quadra natalícia, vinha o Presépio, centro de atracção, para todas as crianças. A Missa festiva, a
realizar-se, em Dezembro, no dia 25, ia ser o auge,
Beijar o Deus-Menino terno e meiguinho, que só por amor, ,nasceu pobrezinho e tão desamparado! Para saudá-lO, precisava o tostão. Por isso, torurava eu os ouvidos paternos, para não suceder o que menos desejava: ficar envergonhado!
Todos os dias pensava, a fundo, na pequena moeda e no grande prazer que iria sentir, ao dar um beijinho no adorado Petiz
que sofria tanto, por meu amor! de véspera ainda, encaminhava-me à igreja, para melhor observar, no silênccio do templo, o rosto hilariante daquele pimpolho que parecia feliz!
Examinando dr fora a pequena gruta, o meu olhar fixava-se também, nas outras figuras que rodeavam Jesus.: o adorável S. José, Nossa Senhora e a amável vaquinha. A esta, afinal, cheguei a querer-lhe bem, só de ter aquecido os pazimhos mimosos do Menino-Deus!
Não era em Dezembro, tempo de frio, gelo e chuva?
Certa figura que turvou a minha vista e logo o pensamento, foi
uma mulher, coloada num triciclo. Vi-me tentado a pô-la no
soalho, para ela rodar. Não me lembro bem, se venci a tentação!
É que ela, de facto, estava apoiada, sobre duas rodas!
Saí do templo muito apreensivo, mas logo serenei, porque no meu
bolsito já eu tinha a moeda para o Deus-Menino.
Após o beijinho, oferecia-lhe então esse exíguo presente!
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53 - Bela Informação
Recebi, com alvoroço, a notícia grata de o tio Zé Fonseca ainda não morreu. Mais velho que meu pai, julgo ter+a agora 83 anos , já que meu pai cavalgaria, de facti, os 81..
Não obstante isso, deu a alma ao Criador, há 15 anos cumpridos!
Pois bem. Este meu tio jamais o vi, que me lembre disso. Não é grande pene viver neste mundo sem ver em pessoa os membros mais caros da minha famíli ! Chego até a julgar que é disparate! Por isso, exactamentte, é que trago na cabeça uma viagem provável aos Estados Unidos. Apenas um sonho?! Redundará ele em grata realidade?!
Quem dera que assim fosse!
A desoesa, porém, é já considerável, uma vez que se eleva a cerca de 12 contos! Voltam apenas um cento de escudos!
Juntar ainda os preparativos, incluindo a estadia... Mas
daria, realmente, por bem empregada a soma dispendida, afim de
visitar pessoas tão queridas, a quem estou ligado pelo coração, pois trazem nas veias sangua do mesmo tipo
Aproveitava o ensejo, para conhecer a grande nação, que dá leis ao mundo, sendo já hoje a primeira potência.
Iria saudar, com todo o prazer, a estátua da libedade e rezar uma prece por todos os oprimidos!
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54 - Etelvina
Esta Religiosa andou associada á munha existência, logo em criança. Ainda parenta, pela via materna, era da mesma idade, ficando as nossas casas bastante próximas. Por esta razão e também porque as mães eram muito piedosas, facilmente nos juntávamos, folgando em companhia.
Quantas vezes, imitávamos, a sério, os actos litúrgicos, integrando-nos a fundo, à maneira dos adultos! Outras crianças ainda buscavam, por igual, a nossa companhia, formando-se por vezes um número razoável!
Prestou esta prima vários serviçoa, em casa de meus pais,
encarregando-se até de velar cuidadosa, pelo meu irmãozinho, que nascera 5 anos, depois de mim!
Ainda me lembro de o trazer ao colo e de ele a chamar, da seguinte maneira: Ó Taldina! Taldina?
Pela minha parte, encontrava-lhe sempre infinita graça, pela
deturpação que fazia na palavra!
Mais tarde jã, foi ama seca da Mariazinha Carvlho Ribeiro e, em seguida, notando inclinação para a vida religiosa, deixou a aldeia e quanto a cercava, incluindo os pais. Estes ficaram chocados! Só tinham uma filha, amparo da existência e única esperança na vida presente!
Apesar de tudo, julgaram-se ditosos, por o Céu lhes conceder uma graça tão grande! Lá foi ela, pois, abandonando tudo, para servir apenas a Deus e Senhor!
Após isso, vi-a só uma vez, quando foi a Vide, em visita aos pais.
Que Deus a ajude, afim de realizar a sua missão.
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55 - Primeira Comunhão
Oh tempos graciosos da primeira adolescência, em que a felicidade era pura e genuína, qual sorriso de criança e tão verdadeira como a própria realidade! O meu pequeno mundo e cuidado permanente estava no lar e no viver interno! Figuras amadas, partidas saudosas, regresso em ânsia,
reparos e conselhos, promessas e castigos, sorriso e canções, oração e trabalho...era isto o meu lar!
Um belo dia, foi-me anunciada importante nova; iam preparar-me, afim de receber o Senhor de tudo. Senti o coração agitar-se no peito, perante um facto que harto deslumbrava , enchendo-me de gáudio,
Tão pequenino e já mauzito, receberia no peito o Senhor Jesus Cristo, o meu bom Pai e Senhor meu Deus!
Dali para o futuro, esmerei-me quanto pude, afim de conseguir dados valiosos,sobre Jesus Cristo, esforçando-me a valer por ser-lhe agradável, para Ele baixar ao meu coração.
A hóstia pequenina que eu via branquejar, nas mãos do sacerdote, ia ser minha, entrando no meu peito. Pensava nissoa todo momento, sonhando até com o dia futuro!... Fazia mil perguntas, sobre tal assunto.
Apredizagem em casa e na igreja paroquial... alvoroço permanente, grande emoção e reconhecimento, perante o facto, deveras grandioso, na vida terrena,!
Chegou, finalmente o dia suspirado, que foi dos mais fe lizes, na minha existência
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56 - 19-o2-1967
O dia 19 deste mês de Fevereiro foi, segundo o uso, um marco triunfal, no percurso da vida que, definhando, vai
perdendo cor. A manifestação, deveras espontânea, de alunos e alunas, as suas demonstrações, tãocheias de poesia; as palavras
amigas e até carinhosas, que me foram dirigidas. hão-de perdurar,
como sendo, realmente, a lembrança mais grata da minha existência,
Como eu vibrei fundo, ao ouvir de seus lábios a sincera confissão de quanto me apreciam! Que muito me querem, porfiaram em dizer.
Hei-de acreditar, em alguma realidade, afim de que a vida não seja tão amara. Por isso, além do nada existente a que me apego para crer, tenho a fé confiante de alunos e alunas. Quqndo ela acabar, pouco mais restará, o que, na verdade, é já bem pouco!
Os primeiros a sair foram, sem dúvida os do 2ºano.
Ofereceram prendas, representaram peças, recitaram poesias, proferiram discursos. Hora foi essa tão agradável, que fugiu o mal-estar e nao verifiquei a menor distracção! E tudo ao natural!
Sinceridade, encanto sem limites, espontaneidade!
Momentos assim, fazem para logo esquecer longas horas, em que o amargo da vida se instala no peito.
O 3º ano esmerou-se também o melhor que pôde, afim de expressar, em linguagem sentida, quanto eles acarinham o seu professor.
Os outros anos guardaram o caso para o dia seguinte
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57 - Tonho
Já não perence ao número dos vivos.,pois a morte o ceifou, na verdura dos anos, deixando no mundo 4 filhos órfãos.
Foi muito infeliz este meu companheiro, á quem, durante a vida correu tudo mal! O seu viver, nos primeiros anos, andou por via de regra paralelo ao meu, que vários factores contribuíram para isso: consanguinidade, tempo do nascimento, baptizado na igreja, folgares da infância e primeiros estudos, já na Primária, já
no Fundão, onde era o Seminário.
O passatempo a que mais nos dávamos, na adolescência figurava uma caçada .As nossas espingardas eram toscos paus, a que ligávamos um velho baraço. No concernente ao cão, já não era tão
fácil arranjar improviso! Apesar de tudo, não havia problema! O irmão Manuel, um pouco mais novo, prestava-se ao caso, e nós, por isso, encantados da vida!
Isto, evidentemente, valia-me boa sova, pois abandonava o mano mais novo, que era ainda pequenino, transgredindo as ordens que a mãe deixara.
Mas como resistir a um convite do Tonho?!
-- Ó Pedro, vamos à caça?!
A estas palavras, tudo esquecia: ameaças e promessas, advertências...tudo.
Aquele Tonho era a minha perdição!
Mais tarde, lá fomos embora para o Fundão iniciar os estudos. Aconselhado a sair, casou em seguida, vindo no futuro a ser recebido, numa Casa de Asilados, pois a cabeça deixara de regular!
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58 - Zé do Aidro
Estou a vê-lo ainda o bom do velhote, sentado num banco, à palheira do Terreiro ou então à vivenda dos antigos Porugais, Ali, apanhava em cheio o sol do meio-dia.
O pobre homem sofria duma úlcera , razão pela qual ostentava sempre um ar confrangedor, sendo pálido no aspecto.
Ninguém dizia mal dele e todos lastimavam seu estado de saúde
Pai de muitos filhos que nutrira honradamente. era amado de todos, o que lhe dava conforto. Às vezes, algo curvado, gemia inconsolável, mas sempre resignado.
Ao passarem por ele, dirigiam~lhe a palavra, inquirindo sinceros, de suas melhoras. " Ó ti Zé do Aidro, hoje vai melhor?
-- Olha que não, rapaz, isto não melhora! São mais alguns dias -- Deixe lá homem! Olhe: pessoa doente é passoa para sempre!
Ele então, com visagem destoante, fazia oscilar, vagarosamente , a cabeça nevada, em sinal discordante.
Nunca ouvi alguém dizer ml do ti Zé!Nem sequer o havia, como objecto de má língua!
Alguns anos volveram, sobre aquela doença, que o minava há muito, até que um dia, com pesar de todo o povo, exalou serenamente o último suspiro!.
Acabava assim um homem bondoso!
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59 - Só um dia mais, para chegar ao fim este segundo mês, que é, na verdade, traiçoeiro e frio. Não fica bem que me insurja contra ele, pois vi a luz, no dito mês! Entretanto, usou tal dulicidade, fez tais negaças e mostrou ainda sorrisos tão meigos, que nos pôs desorientados! Mas, por acinte, desmanchava prazeres, ao aperceber-se de que o género humano delirava com o Sol.
Eu, na verdade, não devia apreciar-te, Frvereiro volúvel e enganador! Se não fora, realmente, que me deste a conhecer, primeiro que os outros, o céu de Portugal! Por isso te amo, enquanto no peito um desejo incontido me leva, desde já, a render-te homenagem!
Deixa, pois, que eu revele a minha alma chagada, em que se anichou o fermento da desgraça. Não vou esconder-te, como outros fizeram, o pungir acerbo de grandes espinhos. A ti e ao Diário confio sereno os soluços constantes que a dureza da vida
originou em mim!
Que me resta, na verdade, além de vós, amigos sinceros?!
Consderava fiéis mais outros dois. Entretanto, se os frutos mostram a árvore, concluo desde já que bem me enganei! Eram só dois, em carne e osso e nem estes dois puderam manter-se! Como é inconstante. mesquinho e vário este bicho pequeno que desgnam por homem!
Restais vós, então, sem osso ne carne, mas constantes e pacientes, sem haver desmentido.
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60 - Ironia das Coisas.
Explanando a matéria do 7º ano, aos alunos de Inglês, deparou-se-nos então a colónia da Inglaterra que hoje faz parte dos Estados Unidos e se chama Virgínia. Foi-lhe dado tal nome, em honra e memória de IsabelI que diziam ser virgem..
Assim reza a História, assim diz a Tradição!
Os próprios Ingleses veneram o monstro, pois segundo eles, ela não casou, afim de consagrar-se, por modo inteiro, à sua nação e ao grande Império.
Uma espécie nova de casamento, de tipo espiritual, a exigir adoração que o tempo não desdoura nem muito menos consegue dissipar!
Que os amigos Ingleses vivan nesta fé. não se pode jamais levar a mal; que nós comunguemos em suas velhas crenças não pode ser havido como recto pensar.
Por que meteu na prisão o grande navegador e brilhante marinheiro,Walter Raley?! De nada lhe prestou haver trazido o tabaco para a loura Albion, pela primeira vez! De nada lhe valeu a resistència quase heróica de que deu farta prova, nas diversas paragens do mundo novo. Com efeito. não obstante o prémio e alta distinção que a Soberana inglesa lhe concedeu, bastou, segundo li, que desposasse o fidalgo uma dama do Paço, para que a rainha o mandasse encarcerar!
Seria a virgindade?!
Não encontro, decerto, na língua portuguesa, muito rica embora de expressões e vocábulos, qualificativo, bem adequado, para exprimir, de maneira cabal, a sua estrutura deveras monstuosa!
Coisas de lamentar, na monarquia absoluta!
Mais tarde escreveria, já na prisão: " Dizei aos homens que são mentirosos; dizei-lhes que o amor não passa de luxúria; que a caridade é fria; que a justiça é injusta."
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61 - Qual fonte obscura, desprezada e benfazeja, que noite e dia jorrasse em vão, assim eu também, esquecido e postergado, não obstante haver no peito um coração generoso, vou definhando, hora a hora, dia a dia, por não ter a quem dar a minha terna afeição
E, no entanto, é exigência da própria natureza; uma força incontrastável que me avassala e breve constrange; inexplicável absurdo, para onde fui levado! Nada me importa que outros se acomodem, emudeçam até, louvem ou condenem! Eu não sou os outros!
Tenho de jogar, necessariamente, com dados pessoais: não com achegas ou dados alheios! Eu sou um indivíduo. O que a outrem se ajusta não acerta em mim! O que a outros adorna, em mim desfeia.
É somente preciso chegar ao pé de alguém; aproveitar-lhe logo a ingenuidade; servir~se habilmente da sua inexperiência;
falsear-lhe a vida, escondendo o lado mau;; incutir-lhe no peito
devoções mecanizadas e atirá-lo, em seguida, para a fogueira do mundo?!
Refeito, em parte, do estonteamento, descerra-se o véu
Faltara ali, decerto, a reflexão; não chegara ainda a maturidade; nunca houvera consciencialização!
Extorquir um sim, aos 2o anos de idade, havendo furtado o uovem rapaz a todos os contactos,é um abuso sem nome,.. exorbitar sem perdão!
Onde a lucidez... o conhecimento... a comparação?! Onde
também o aferimento... o necessário estudo... a preferêmcia?! A
mesma opção?!
E se juntarmos a isto a reacção incompreensívelde alguns progenitores que exigem dos filhos o que eles não devem nem podem alienar?!
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62 - Ia já no fim o mês de Agosto, começando a falsr-se, a propósito do "assunto", Por star bem fundo, no peito de todos,,
ningu+em havia ali que ignorasse o caso: a vinda a férias do Padre Zé Maria. Era já costume velho.
Após a ida para o Outeiro, passava a existência em Vide-EntreVinhas, durante o mês de Setembro.
Assim é que pequenos e grandes, homens e mulheres, casados e solteiros, todos a uníssono, esperavam, com ânsia, o
regresso, em breve, do seu bom amigo, Prior da freguesia!
Poia não tinha ele uma palavra amável, para cada um ?!
Fosse embora uma criança, havia um sorriso, um ar paternal e
deveras carinhoso, a que mágicas palavras emprestavam cor: " Tu, meu menino, és do João, que eu tiro~te â casta!"
E o pimpolho corava, sentindo ufania, pois o velho Prior que todos amavam, dirigia-lhe a palavra!
E os belos doces com outras guloseimas viriam também. segundo
era uso?!
Palpita assim o coração dos grandes, estremecendo igualmente o dos pequeninos! Faltaria muito?:::
-- Quem é esse Padre, por quem todos suspiram, querida mãezinha?
-- É o senhor Padre, José Maria Martins, um grande e bom amigo, que já o foi também de teus avós!
-- Então quer bem a todos?
-- Oh, sim, pois não?! Um coração como aquele! Uma alegria serena como apenas o justo é capaz de possuir!
-- E já falta pouco, para irmoa esperá-lo ao Alto
Piolho?!!
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63 - Ao abrir a janela que dá para Nascente, logo experimentei agradável sensação, que prestes me falou de suave Primavera.
Não que as andorinhas já tenham regressado a seus velhos lares, mas a verdade é que o rigor invernal já se extinguiu. Os arrepios fundos que tomam o corpo e o sacodem, às vezes, deixaram de existir. A vida agora parece diferente!
Além , no horizonte, vai já clareando a ridente manhã, que se apresenta fagueira e cheia de promessas; as andorinhas, convencidas também de que o tempo dos ninhos é chegado já, saúdam alegres o raiar do novo dia, postadas agora no topo das árvores.
Sentimos bem que a Natureza, começa a renovar-se. Vai por toda a parte enorme euforia, que se traduz bem visivelmente,
em palavras e atitudes, Melhor disposição... falas mais serenas...
optimismo em barda, expansividade... alegria de viver!
O olhar é mais vivo, os movimentos são ágeis, o sorriso mais aberto. Que é isso, pois, que tudo modifica, interiorizando-se no meu próprio ser?! Algo de celeste que vem lá do alto e que o nosso bom Deus nos envia pressuroso: a bênção da Primavera!
Apressa-te, pois, estação risonha, e vem breve trazer-nos um pouco da tua alma e larga parcela do teu coração! Faz-nos melhores , infundindo em nós o gosto da beleza, assim como também a graça do optimismo?! Derrama teus dons em larga abundância, que suspiramos todos pelo teu regresso!
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64 - Se bem me lembro ainda, era nesta ocasião que os filósofos da Guarda festejavam S,Tomás O que ali se não fazia! Que planos grandiosos se congeminavam! Quantas canseiras e altos sonhos!
No 6º ano, levei o meu arrojo a fazer modesto hino ao Patrono dos Estudos! Da letra para ele encarregou-se o Bernardo.
Quantos momentos arrancando notas... substitindo em seguida, algumas figuras e harmonizando a parte do coro!
Tenho ainda na memória a estupefacção dos mais adiantados, ao verem lançar exíguas colcheias, nas pautas brancas duma folha qualquer!
Arregalavam os olhos, muito à socapa, não fosse outrem julgar que não eram capazes!
O que pode, às vzes, a falta de humildade e a carência de modéstia!
Por minha parte confesso que também não ocultava os dons excelentes que a Divina Providência me havia concedido! Foram mal explorados, infelizmente, pois faltava docente, bem habilitado, para resolver as dificuldades, e dar as noções que eram precisas.
Aos tropeções, lá se foi indo, mas sem voos nem firmeza!
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65 - Por baixo da cinza que os anos amontoam, esconde-se o brasido que vem do passado. De vez em quando, solta labaredas que, a pesar meu, vão logo extinguir-se.
Como é já diferente o estuar das paixões! A sua voz não morreu.
no entanto, é pausada, intermitente, descolorida!. Que seria de nós, se ficasse, por igual , a viveza e ardência da primeira juventude!
É bem exacto o velho provérbio:" O tempo tudo leve e tudo traz!" Trouxe-me desenganos , sedutoras promessas, ilusões e sonhos, que se provou, em breve, não terem fundamento! De que mais ninharias se fez acompanhar?
Era,sim, um cortejo deslumbrante, cuja só vista causava logo pasmo, diria até profundo espanto!
Julguei-me super-homem, fadado no mundo, para coisas insólitas. Sem nada haver feito, reputava.me já elemento ímpar!
Que fariam, sem mim?! Ideias originais, expediente singular, actuação inusitada iriam resolver o que ninguém conseguira!
Os outros tinham falhado, pois lhes faltava acuidade e génio.
Por isso, aguardavam todos que eu agisse no tablado.
Seria como César, escrevendo ao Senado: " Veni. vidi, vici
Fiz mais que eles? Tanto que fosse!
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66 - Galisteu
É pequeno aglomerado que fica a Oeste de Vide-Entre-Vinhas. Não sendo freguesia, possui na verdade facetas próprias, algumas das quais harto abonatórias.
Assin: embora vizinhos e próximos de Vide, os seus habitantes, de maneira geral,, são mais trabalhadores, granjeiam mais dinheiro e, por via de regra, pagam melhor aquilo que devem.
De notar, ainda, que se ajudam,mutuamente, revelando, portanto, maior união,e são mais respeitadores, embora mais simples.
Foi bastante débil o meu trato com eles, pois minha mãe trazia-me vigiado, a partir de criança.. Por outro lado, não tendo ali família, que me puxasse, às vezes, levando-me para lá, as gentes de Galisteu eram para mim pessoas quase estranhas. Isto que digo, nos primeiros anos!
Mais tarde, porém, ouvindo apreciações a minha boa mãe,
acerca dos habitantes, comecei desde logo a nutrir apreço e grande estima.Não sei bem a razão por que ela assim falava, cheia de afecto e muito carinho, para aquela gente.
Tenho para mim que foram, na verdade, as qualidades morais, que obraram o milagre. A verdade indiscutível é que sinto
igualmente afeição e carinho, inspirados talvez pela nobre autora de meus dias mortais.
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67 - Entrada na Vida.
Como Sol radioso que se avista no Oriente, em bela manhã, asim eu também, esperançoso e um tanto ingénuo, estreei confiado os meus primeiros passos.
Era risomho o surgir no tablado que trazia, o peito cheiinho de promessas. Quem dá o que tem parece-se com Deus, e eu contava dar muito, sem então me lembrar que as outras pessoas iriam fazer figas à minha passagem e que um peito vazio jamais pode encher quem esteja à sua volta.
Iludi-me pois.
A 26 de Setembro de 1943, dava eu entrada no palco da vida.
Como nada conhecia, a respeito do mundo e suas manigâncias, sendo este já batido e muito calculado, enganou-me largamente, com sorrisos postiços, adrede preparados.
Cumprimentos em barda, amabilidades, muitas reverências e
delegações,; vozear hilariante, esfuziar de foguetes, gentileza postiça e atitudes calculadas eram apenas o dobre a finados para o meu antecessor e o prelúdio trágico do meu baquear..
Este mundo é balofo! e deveras travesso!
Isto, afinal. deviam ter-mo dito, com larga antecedência, para não julgar só, pelas aparências Assim, foi bastante maior a logração... irremedável o estado de espírito... inevitável o mais que veio.
É isto sempre o que nos espera, em circunstâncias algo idênticas.
As grandes Revoluções e atitudes incendiárias,levam sempre o homem, dum extremo ao outro
Hoje, nada tenho do que então possuía, melhor talvez, julgava possuir! Ideal, aspirações, projectos a montes e infindas soluções.
Uma coisa me resta: a crença em Deus, na sua Paciência e
Bondade infinita!
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68 - O Dr. Abrunhosa (Médico)
Conheci-o na Vide (Seia), onde fora criado um Posto Infantil. Já foi há 20 anos, mas não posso esquecê-lo, pela amizade sincera que nos ligava a ambos.
Se o visse, de novo, já o não distinguiria, entretantot, no peito saudoso, guardo sempre a lembrança, que nem a morte conseguue tirar!
Havia, de facto, entre nós dois, algo poderoso que não deixava nos separássemos. Ele era Médico, e eu Sacerdote; ele
materialista, e eu espiritualista; ele bastando-se, e eu também,
sentíamo-nos ambos muito à-vontade, quando em presença.
Quem nos procurasse raramente sucedia encontrar.nos
afastados. Para assunto de conversa, elegíamos somente o que agradasse aos dois. Com 35 anos ( mais 1o do que eu), baseado ainda no que a vida lhe ensinara, falava convicto, pondo nos dizeres todo o seu calor.
Por todas as razões e por sua grande estima, que a fundo me quadrava, ouvia-o sempre com grande interesse, fazendo ele o mesmo, em ordem a mim.
Nunca mais te vi, prezado e bom amigo. Entretanto, jamais te esquecerei. A memória fiel e o coração dedicado fizeram de ti o meu alvo preferido . Como a vida é cruel! Separa os que se entendem e aproxima os que se odeiam.!
Surge, Dr. Ivo! Aparece, uma vez mais, nos caminhos da vida.Sê o amigo certo que foste no passado, para eu dizer, com inteira verdade que, no mundo ruim, cabe ainda a amizade e a compreensão!
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69 - O ti Carriço
Toda a gente morria, mas o ti Carriço, que nós
conhecêramos sempre já velho, não havia maneira de tomar decisões, respeitantes ao final!
Da morte ria-se ele! Ao passo que outros velhos, mais novos que ele, frequentavam a igreja, com mais assiduidade, entregando-se à oração, ele gracejava, de cabeça azoada: "Já lá hê-de incuntrar mais! No Inferno?... Até se há.de estar lá bem, pelo tempo do frio!"
Era assim zombeteiro o ti Carriço velho.
Quando novo, dizia meu pai, era um valentão! Seu prazer habitual consistia em pôr à bulha o garotio da aldeia.
Nunca soube, por experiência o que eram dietas, em comida ou bebida! À noite, regalava-se o macróbio, com um prato de feijão, a nadar em água-ardente ou então jeropiga! Fosse um litro ou mais, nunca tombava, podendo sozinho dirigir-se ao quarto.
Em tais ocasiões, irrompia atrevido para o genro Albertino:
" O quê?! A alma é o sangue, homem!"
E quando alguém o vinha llamentar, na sua presença: "
Ora, mesmo assim, ti António!"
Ele, zombeteiro, ria e troçava:" Que me mandem pra onde quijerem!"
Quando os anos caíram , o ti Carriço mudou a conversa e as atitudes! Parecia já outro!
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70 - A Escola Nova
No Chão do ti Cabral,, sito no Outeiro,levanta-se
agora um edifício novo, cujo terreno fora ofertado por aquele benemérito. Tem forma de rectângulo. Não sei, realmente, que é que presdiu à sua estrutura.
A planta da Escola foi mal concebida, pois na verdade, ficou sem janelas, a Sul e Nascente. Tem uma para Norte, sem que exerça influência no corpo do edifício, e duas a Poente, de tamanho enorme! Deste lado, encontra-se também a porta de entrada, vendo-se um canteiro, de-lés a-lés.
Foi erguida a Escola em 1931, fazendo-se logo a inauguração, no
ano seguinte. É nesta data que o nosso Professor, José Ribeiro de Almeida, tendo renunciado à Escola de Salgueirais, toma a seu cargo a instrução dos jovens de Vide-Entre-Vinhas.
Logo de entrada, apresentam-se 4 para a 4ª Classe: António
Prazeres, Fernando Nave, Pedro da Fonseca e Joaquim Lopes
Rainho.
Andávamos todos pelos 13 anos, menos o Fernando que já tinha 16. Uma lança em África! Quem desbravaria um terreno tão duro?!
Só a paciência do nosso Profassor!
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71 - O ti Coixinho
É hoje, por certo, o mais velho sujeito da
minha freguesia.Chamam-lhe assim, bem entendido, por ser deficiente Cavalga em breve os seus 90 anos, apresentando, no entanto, um aspecto sadioe bastante invejável.
A máquina! interior é extraordinária, pela robustez e grane consistência!
Com os meus 43, sempre o conheci como ele agora é..Até julgo, às vezes que a roda do tempo já o olvidou! Todos morreram! Só ele tem ficado! Todos choram, às vezes: só ele vai cantando! Todos adoecem, mas ele ainda não!
Figura velho roble, postado na montanha, enquanto a vegetação, murchando a seu lado, acaba por morrer, ele ergue-se
direito, indiferente e altivo, não dando conta de que o tempo se esvai..
Ó velho ti Coixinho, onde foi que me surgiste, pela primeira vez? Fazia eu caras ao Lameiro da Serra, procurando seguir o trilho dos bois. pachorrentos e amigos, que meu pai conduzia.
A travessando alheado o Lameiro serrano do velho ti Cabral,
dialogaste com meu pai, ficando eu surpreso, quando vi o teu rebanho!
Como se chama aquele homem, inquiri eu logo, após o encontro?
-- É o ti Coixinho que anda na serra a guardar o gado!
Meditei no caso, durante uns segundos, porfiando ali não
mais olvidar o nome carinhoso da nova personagem..
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72 - A velha igreja de Vide
Minha igreja velhinha, onde levei horas de imensa beleza e suave poesia! Dizem por aí que vais ser demolida, para dares lugar a um templo moderno. Eu, no entanto, fico a teu lado, e o meu coração agonizará contigo, quando os teus muros, trementes e decrépittos, forem atirados ao solo jacente!
Choratei contigo a dor provocada pelas novas gerações, que nada respeitam, ainda a tradição, veneranda e amada que a ti se liga, desde o passado. Bem sei. há muito. que tu. ao presente, não ofereces já condições de firmeza nem segurança e que o teu aspecto é assaz lastimoso. Ainda assim. é quando mais te amo e te
quero muito mais.
Na verdade, um perfume inebriante se evola de ti, o que faz transportar-me aos dias remotos de um passado feliz!
Meu coro antigo, inseguro e receável, testemunha esquecida,
que viste meu pai, comigo à frente, estando eu ali, pendurado nas grades!
Poderei agora ver-te apear, a golpes febris, profanando assim a memória grata da infância descuidada?!
Altar-mor e baptistério, sacristia e púlpito, ireis vóa imergir no silêncio do nada?! Situação lutuosa, após terdes realizado funções relevantes!
Ao Domingo, dia do Senhor, era sempre festa! Que bem me sentia, no interior de teus velhos muros! Re spirava-se ali o odor de uma vida que não morre jamais! Recebíamos noções que davam acesso a um viver mais santo; descarregava-se o fardo que era o nosso pecado, revestindo-se logo o homem velho da cele ste indumentária
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73 - A ti Paixão
Vellhota baixa e algo atarracada, era um tanto ingénua, mas sepre bondosa! Fiava-se em extremo no que lhe diziam, não olhando à pessoa nem sequer reparando em graves
circunstâncias. Por esta razão, houve de suportar vários contratempos, dentre os quais emerge um , a que vou referir-me..
Não sei como nem porquê, o rapazio da aldeia engraçou com ela, descobrindo-lhe um fraco. Ao que parece, tudo se originou, em simples conversa que ela teve com alguém.
Andava a Serra, dizia repesa e fora surpreendida por horrendo tempoural. As suas cabrinhas, achando-se dispersas,ñão viam a pastora, motvo bastante que as levou em breve, nos lajedos, onde havia um abrigo a acolher-se
Receando pior, começa a ti Paixão a espilrar com ânimo, tendo por objectivo que viessem ter com ela.
Entretanto, não havia maneira de as fazer desalojar! Por mais que repetisse, não havia maneira!
Nos dias que seguiram contava a toda a gente a história das cabras,, ocorrida na serra.
Ora, como o Zé povo fareja tudo, para encontrar zonas propícias,
já tinha o filão, para se divertir! Bastava somente experimentar, a
ver o resultado!
Foi nestas insistências que a malta brava logo se apercebeu de que havia bom terreno, em que podia actuar. É que a ti Paixão
ficava desesperada, assim que lhe espilravam. Dava, ben entendido, por paus e por pedras! Em tais momentos, acrescentava logo: Não fora eu burra, espilrando às cabras, o dia da trovoada!
Era este, na verdade, o seu grande calvário!
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74 - Portela.
Esta é, na verdade, a rua mais longa de Vide-Entre-Vinhas. Desde o Calvário até ao Terreiro, vai grande extensão. Sendo eu criança, tinha ainda o Correio e bem assim a Escola Primária que hoje se encontra em zona diferente.
Também o velho forno ali seencontrava. Igualmente ali ficava a igreja paroquial bem como a residência do Prior da aldeia.
Entretanto, o que mais faz entrar em forte vibração a lira da
saudade são as carreiras da péla. Foi nessa rua que eu me estreei,
adquirindo propensão e rara habilidade no manejo dela.
A princípio, fazia parte de grupos numerosos, em que raramente chegava à péla. Entretanto, assim que pude afastar-me,
passei logo a jogar com os da minha idade, aproximadamente, e só em grupos de dois ou ainda três ou quatro.
Mas não posso esquecer esses jogos animados, em que punha alma e vida, afim de não perder o pobre meio tostão, que entregara, no princípio.
Havia três carreiras, na rua mencionada; à porta do ti Nunes; do Senhor Prior; a do Calvário. Esta era então a mais concorrida e de mais animação..
Prazer sem medida era, decerto, ver jogar ali o António Rainho, cuja mão certeira se tornava fatal! Para onde ele tombasse, aí caía a sorte! Todos anelavam pertencer a esse grupo.
Ao lado, sentados no chão, encontravam-se olhando os que a vida queimara, em suas refregas: a ti Ana Prazeres; a ti Eufrásia velha e o ti Nunes velho...
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75 - A Escola Antiga.
Nunca ali fui, com assiduidade. A princípio, ia somente para matar a curiosidade; em seguida, achei graça àquilo e, de vez em quando, lá voltava, de novo, mais para distrair, observando o que faziam, no grande salão.
Eram as aulas em casa particular, integrada no casal do Padre Fernando, que já por sua vez o herdara dum tio, com a mesma profissão.
Este edifício, na rua da Portela, tinha dois compartimentos,
ostentando duas portas, voltadas a Poente: uma dessas entradas
servia a Escola; a outra dava para a vivenda. Esta fica a Sul, mas não tem janelas, pois ao velho edifício encosta-se uma leira que chega ao beiral.
Quer isto dizer: o montículo rochoso, de nome Outeirinho,
ergue-se exactamente do lado Sul, tolhendo assim a luz e tornando escura, húmida e fria tal habitação.
Como se vê, as condições sanitárias não eram as melhores! Mas agora me lembro: na zona do salão, destinado às aulas, surge
um quarto provisório, com anteparo. até meia altura, resolvendo, em parte, o caso da habitação.
Bem se deixa ver que a pedagogia levou mais um golpe, visto que o recurso tornou mais escura a sala de aula, tirando à
quadr uma das janelas.
Dispunha também duma clarabóia, mas a nogueira roubava-lhe a luz. Por consequència, restava apenas uma janela, voltada a Norte.
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76 - Às Cruzes das Almas.
Antes de haver estrada, o caminho das Cruzes levava a Galisteu, sendo ele então via obrigatória, para cortejos fúnebres, com rumo ao cemitério. Hoje, porém, o tráfego desviou-se. para seguir a nova artéria, que passa ao Fomseca, lá baixo ao Fonseca. Entretanto, o que mais desperta e logo aviventa a meiga saudade não é isto, exactamente.
Os seus velhos habitantes e a carreira da péla! Isto, sim,que fala bem alto ao meu coração, numa linguagem que tem seu encanto.
A tia Inês, lá na extremidade, velhinha e já viúva; o ti Zé Carrapichana, com a sua Laurinda, tão infantil, embora adulta; o ti Chico das Almas, na outra exremidade, junto à Memória que deu o nome ao agregado!
Encontra-se esculpida, em velho monolito, uma representação, alusiva ao Purgatório, motivo exacto por que chamaram Cruzes das almas ao dito lugar.
Quem passava ali descobria-se logo, rezando em seguida, pelas benditas Almas! Logo em frente da Memória, erguia o ti Chico um montão de giestas, provisão abundante para os longoa Invernos!
Agora me lembro de grande patifaria! Uma vez, trancaram-lhe a porta, no lado exterior, enquanto a malta levava a lenha para a grnde fogueira desse Natal! Foi de mau gosto, não haja dúvida!
Embora o chão do local não fosse direito, praticava-se ali o jogo da péla.. Algumas vezes, lá joguei também, integrando-me num grupo que era altamente! do meu agrado.
Esta é. pois, a mais grata lembrança das Cruzes das Almas
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77 - O Forno
A taberna e o Terreiro assim como o forno eram lugares de encontro marcado, onde raro escasseavam amigos e compartes, em farra e boémia. Sem teatro nem cinema, desprovido também de luz eléctrica, bem como de estrada e mesmo telefone, vivia o povoado à maneirra antiga, ignorando o que sucedia, a pequena distância.
Igual situação tocava a Prados, terra de meu pai.
Lá nasciam, lá morriam mas, emVide-Entre-Vinhas tudo se ignorava.
À falta de assuntos, estranhos ao local, explorava-se o próprio, dando-lhe, por vezes, cores animadas. Ora, dentre os lugares, já mencionados, nenhum havia, bem creio eu, adequado, como o forno, para tal finalidade. Quer em uso quer não, sempre havia ali gente! O frio, a fome ou o jogo faziam daquela estância o lugar preferido.
Atenção especial havia, decerto, para os cronistas, seleccionados e de boa memória. que tudo sabiam, acerca dos antigos. Lances arriscados, cenas de valentia, peripécias de viagem... tudo ali corria, animado e colorido!
Os mais velhos confirmavam, " É verdade! Pois isso! Essa conta bem sai!" Os mais novitos arregalavam os olhos, desmesuradamente, para reter melhor aquilo que reputavam como
grandes proezas dos seus maiores!
Quando o forno parava, jogava-se e bebia-se, à porta fechada!
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78 - Ocorre, ao presente, o mês de Março. Em vez do anúncio "chegaram as andorinhas", outro bem diferente irrompe dos lábios" chegaram as moscas!"
Hoje, logo cedinho, fui molestado por dezenas e dezenas de antipáticos insectos, que se haviam instalado, no interior da casa.
Como foi desagradável este contacto molesto! Nem o alvor luminoso da bela Primavera conseguiu dissipar tão funda impressão!
Como elas se bamboleiam, sensuais e felizes, através dos raios mornos , coados pela vidraça! Deu-me ali vontade, quando não fúria até, de investir contra elas! É que sujam tudo, incomodam sempre e são, ao mesmo tempo, agentes de enfermidades!
Não pedi contas ainda, mas não prometo usar de contenção, nos meus contactos! Dispenso tal presença e não me inquieto, se estou sozinho! Desejara antes que não aparecessem, ainda que fosse, para anuncar a formosa estação!
A isso virão as meigas andorinhas, mais dia, menos dia, as quais, por certo, não querem aborrecer-me! São mais delicadas e não se comprazem, nos lugares imundos!
Sinto enorme repulsa, quando uma atrevida, cheia de petulância, vem fazer assento, no meu pobre nariz! Isto, é claro, sem a minima atenção1 Pois se ela aparece, já meio desfeita, na comida a ingerir!
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79 - Zé Catrino
Em verdes anos, era afamado, por sua valentia, o que dele afugentava todas as crianças. Por isso mesmo, ninguém jamais queria medir foças, pois corria perigo de ficar em vergonha! Irrompia num ai, levando após si quanto se opunha.
Um dia, porém, o nosso criado, o Manuel Diego, que não era capaz de ficar-se a meio, desfecha-me prestes esta sugestão,
com ar imperioso: " Hoje, quando formos daqui.( era na Tapada Ribeira) vais desafiar o valente Zé Catrino!"
Isto, a mim, afigurou-se absurdo, pois valentes rapazes, mais velhos do que eu, não se abalançavam a tal proeza.
Foi assim mesmo que pronto recusei
Compreendia-se lá uma coisa destas! Espalhei-me logo em escusas sem conto, alegando com firmeza razões bem fundadas.
O Manuel, porém, é que não se convenceu! Fiado talvez na minha resistência, de que não fazia o uso devido, esclareceu-me logo, acerca do assunto, com grande proveito.
Tu não sabes agarrar-te, frisava ele, com grande firmeza. É preciso logo separar as pernas! Tu fazes ao contrário: junta-las,
sempre! Além disso, enclavinham-se os dedos, atrás das costas do nosso adversário! Uma vez colocados nesta posição, sublinhava ele, com grande calor, força-se o parceiro, tentando derribá-lo.
O que te falta é longa prática! Expeimenta e tu verás!
Ao notar, finalmente que eu hestava, alegando, a propósito, ser mais novo, pelo menos três anos, joga o último cartucho: " Se houver azar, lá estou eu, para defender-te!
Potamto, ao passares, em frente do pátio, junto da latada, dizes assim: Queres alguma coisa comigo? Salta cá para fora!"
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80 - O Pisão I
Apertado no fundo, entre encostas suaves, alastra a verdura, por uma nesga de terra, que se desentranha, abundantemente, em milho e feijão, batata e o mais!
Desde verdes anos me pus em contacto com este rincão, onde meu paizinho gostava de ficar, horas sem conto. Perdido ou achado, enquanto as pernas responderam à vontade, era de facto ali que devia procurar-se.
Donde tal apego ao pequeno Lameiro, varrido anualmente pelas águas da trovoada? Lembranças, por certo, dos tempos de criança, que decorreram calmosos, à sombra refrescante de seu arvoredo!
Para ali chegar, não se torna difícil, pois segundo o rifão, todos os Santos ajudam, quando é a descer. Ao subir, porém, há-de haver boas pernas, caso contrário, fica-se a meio.
Como era natural, apeguei-me também à herança paterna, que foi teatro vivo de inocentes brinquedos. Quem dera recuar os anos precisos, para suavizar esta ingrata aridez, com o suava perfume que dali se evolava!
O autor de meus dias limpava a ribeira, erguia os muros, fazia regueiras, ampliava o terreno e varria persistente as folhas dos castanheiros, bem como das nogueiras. E quando a tempestade, como por acinte, desmoronava, impiedosa, quanto ele construíra,
voltava, de novo, com o mesmo fervor, lutando porfioso.
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81 - O Pisão II
Vai correndo Outubro e, junto com ele, o tempo das castanhas.. No velho soito, anexo ao Pisão, bem como ao Laneiro, vários castanheiros, seculares e copados, se desentranhavam em benemerência! Era de vê-los, sempre ajoujados, na periferia, oferecendo alegres o fruto desejado.
Lá bem no alto, centenas de ouriços figuravam sorrir , ostentando no seio duas belas castanhas. O mais leve movimento, quando não o mesmo peso, fazia-as, em breve, atirar-se ao chão.
Camada soberba, a perder de vista, enchia, por ezes, dois ou três sacos! E transportá-las?|
A burra possante encarregava-se disso. Ninguém se afligisse!
Uma tarde em cheio, se não o dia todo passava eu ali, apanhando cuidadoso as louras castanhas. De vez em quando, apontavam-me à cabeça ou faziam tangente à orelha incauta!
E a faina prosseguia: importava dar-lhe fim, antes que a noite chegasse tenebrosa.
Ali à volta, erguiam suas vozes frescas raparigas, amenizando a tarefa, com doces cantares. Entrementes, a noite caía, inesperadamente! O encovado lugar, o negrume do céu, e a
pequenez dos dias, vinha tudo juntar-se, com o mesmo objectivo:
envolver o Pisão em densa treva!
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82 - Cataldo -
Falei já de alguém que Deus tenha em glória e me afligia, nos tempos de rapaz. Apesar disso, não lhe quero mal.
Deus e Senhor lhe tenha perdoado. O que deixei escrito, a respeito dele, posso repeti-lo, a respeito de alguém que exerce, ao presente,elevadas funções.
Parece-me que os outros, com iguais instintos, deram à costa,
exceptuando dois.. Há sempre milagres, na Igreja de Deus: uns de ordem física; outros ainda, no campo moral..
Apraz-me acreditar que estes dois casos pertencem, na verdade, à segunda escala. Sombra de cortesia ou entaõ delicadeza era coisa estranha que eles não tinham. Imperava neles a ignóbil vileza, e assim também a deslealdade, a que vinha juntar-se a cobardia, de mãos cerradas com a traição!.
Só em grupos de 1o ou então de 12, é que investiam , contra um dos caloiros. Agora me lembro que, de uma vez, eram eles 12, contra a minha pessoa! Lançaram-me debaixo e pisaram-me todo, como se faz, por vezes, ao lixo dos caminhos.
Inpotente, no caso, procurava depois, surpreendê-los, isoladamente, pagando. nessa hora, capital e juros. Houve que defender-me, contando só com Deus!
Ganhei fama de valente e fiz-me recear, porque eles me obrigaram a agir assim.. Nunca provoquei! Defendia-me apenas!
E havia uma Casa, para nutrir monstros, com figura de homens?!
Dias negros foram esses, que me fazem espanto, ainda nesta idade!
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83 - Um Provérbio Árabe
"Deixar um filho, escrever um livro ou plantarar uma árvore".
É interessante! Volveu sobre ele o tempo e a vida, apesar disso, não perdeu ainda a sua validade!
A terceira parte já está preenchida, pois diversas árvores atestam, de facto, a minha presença! No tocante à segunda parte, ignoro ainda se virá um dia a ter realização, embora tenha, realmente, assuntos diversos, lançados no papel.
Que destino levarão? Uma fogueira voraz que lance no olvido tanto sacrifício?! A expressão exacta de tantos suspiros, e ais sufocados?! Produto amargo de tantas horas, curtidas em dor?!
Não calculo bem, mas creio ascender a vários volumes
(pequenos tomos), ao longo de 14 anos.
Nada ainda publiquei! Será receio, talvez, ou então descuido?! Era bom resolver-me, ao fazer os 5o.
Ficaria um padrão, assinalando o meio século e, ao mesmo tempo, seria incentivo para novas decisões da mesma natureza.
Entretanto, os problemas são bastantes: falta de tempo; delicadeza de certas matérias¸aspecto financeiro; enfim, aquele optimismo que vem imunizar, preparando o escritor , afim de lançar-se, com toda a alma!
Aquilo que mais custa é o primeiro impulso.
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84 - O tempo não pára, e a vida também não!
À medida que avança a roda fatal, sinto na verdade que o terreno me falta, debaixo dos pés e que um vazio profundo se abre e avoluma, dentro de nim!
Qual peixe fora de água, ambiente natural, assim eu também, levado por mãos estranhas, que imprimiram em mim, quando verde ainda, a marca do imfortúnio, continuo egetando, no oceano amargo que é o meu viver!
Por isso é que a existência não reveste para mim qualquer interesse! Essa é, de facto, a causa-mestra de não me radicar; o motivo real, por que nunca medro, para só definhar, a olhos visto.
Fiz grande mal em não decepar essa mão criminosa; errei confuso, deixando-me levar por um belo ideal que, no entanto, não era para mim! É que ele, naverdade, foi a voz da sereia, para os meus ouvidos: se não existe a mitológica, outra pior e mais terrível ainda, gerou impiedosa a minha desventura.
Hoje, sinto-me frustrado, sem dosto de viver, nem sequer tendo o que exige a natureza, que o não recusa ao ser vivente: amor e carinho, imolação, estima e apreço, compreensão e família prezada.
Deus do Céu a quem eu adoro e mais que tudo prezo, por que é que os homens são verrinosos, torcidos e sabujos, impondo aos outros o que eles...
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85 - Capaços
Levou-o a morte, durante o Curso! Eu no 1º ano, e ele já no 4º! Pelo estofo do Polónio bem como do Cataldo, podemos ajuizar, acerca do tal. Pareciam fundidos nun único molde, sendo preparados no mesmo cadinho!
Deus que é justo, como creio realmente, deve ter-lhe aplicado uns bons correctivos, antes de admiti-lo, no Reino da Paz! Ainda assim, o que lhe desejo é que seja feliz, na Pátria ditosa.
Tuberculose, de tipo galopante, minou-lhe em breve os fundamentos da vida. Bem advertido e muito acautelado, em tempo favorável, não prestou, seguidamente a devida atenção. pelo que a doença o fez passar wm breve, desta para melhor!
Era também o diabo em pessoa. Um dia, porém, veo a desforra. Encontrei-o sozinho, armando a ratoeira! Espera, menino, que eu já te digo! Devia ser,talvez, da mesma idade que eu, não obstante a diferença, no tocante aos estudos.
À volta da estrada que liga Alpedrinha à vila do Fundão (hoje cidade), havia uns arbustos que vergavam, sem partir.: aveleiras flexíveis e vergônteas novas de castanheiros. Cortada quase a pique a vertente da Gardunha (serra), era tentadora e, ao mesmo tempo, um grave perigo, para jovens caprichosos!
Quis desalojar-me, vendo os meus braços firmados num junco.
Nisto, algo enervado, cinjo-o pela cintura, arrastando-o na queda e servindo-me de estrado. O baque na estrada foi assustador! Tive muita sorte em não ficar por baixo, após havermos rebolado, pela ribanceira!
Era assim a vida, nos anos 30, na Cova da Beira!
Seria, realmente, uma Casa de Formação?!
Eu era caloiro, e ele finalista. Sendo eu mais forte e caloiro ainda, queriam dominar-me, sujeitando-me a caprichos! Isto, porém, é que não conseguiram!
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86 - A existência terrena é feita de nadas que trazem consigo a morte ou a vida aos pobre mortais. Um olhar altivo e inusitado, um desvio intencional, um passo alterado, uma atitude vimcada,
tudo iso é razão, para afligir os poucos dias, que nos esperam na Terra.
Um belo sorriso, que mal acaba de esboçar-se; uma palavra embargada na garganta; um ai fugitivo que morre sufocado... imponderáveis coisas , que salvam ou matam!
E é de bagatelas que eu trago, na verdade, a existência pendente? Qual é, pois, a minha recompensa?! Desilusões, contratempos vários, decepções e logros! Que prémio reservararam à minha ingenuidade?! Ser minucioso, descendo em regra a coisas bem pequenas!
Já me lembrei, uma vez ou outra, de que o meu sofrimento não abate ninguém?! Por acaso, ten eco em outra pessoa?! Já o teve, decerto, num ente querido que a morte levou!
Agora, porém, a dor e a tortura, moram comigo, para servir-me aqui da expressão utitlizada por Eça de Queiroz, no Suave Milagre.
A dor, afinal, fez-se companheira e grave espiona de todos os neus actos, que julga,a rigor, como faz um juiz! Entretanto, já estou habituado!
Quando é que voltas, ó sol benfazejo, que douras meus dias,
criando em mim o gosto de viver?!
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87 - "Parce mortuis"!
Bem sei, há muit já, que é grnde mal falar dos mortos! Roça, na verdade, pela cobardia. Nem gosto de o fazer, pois me repugna, extremamente! O caso, porém,é que não há regra sem excepção! A própria História que é mestra da vida,
verte luz a rodos, neste capítulo.
Que diz ela de Cromwel, Richelieu, Pombal e tanto outros?!
Respeitou, acaso, a sua memória?! Como fazê-lo, se as obras iníquas violaram, a fundo, o direito das gentes?! Sem nenhum rebuço, foram elas de encontro a básicos princípios da pobre Humanidade!
Se alguém , neste mundo, por orgulho desmarcado, foi
carrasco vilão, que não respeitou a liberdade humana, as gerações vindouras levantar-se-ão, em potente coro, para esconjurar os famosos verdugos.
Aqueles indivíduos que um dia amarrotaram as páginas brancas, onde se lia claro o destino livre do ser racional, não podem jamais esperar descanso , ainda após a morte. Os próprios mortod sairiam de suas tumbas, nada havendo aí a serenar-lhes a mente!
Também eu, por meu turno, verbero acremente e até amaldiçoo tanto os magarefes como os tiranetes que, postados impantes , no meu caminho, fizeram desviar-me!
Senhor, meu Deus, tu que és tão justo, olha cuidadoso ao que me fizeram, porque fui torcido, alvejado até e, sem clemência... constrangido, quase violentado!
Obrigaram como deuses e pecaram como homens
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88 - Aula rendável
O grande segredo, para que uma aula traga proveito, reside no seguinte: interessar os alunos em assunto agradável, prendendo as atenções. Os mesmos castigos, físicos ou morais ficam abaixo, em questão de eficiência. Pouco ou nada valem, pois muitos deles vêm já de casa habituados a isso. Aquilo que não move, não agita nem prende é logo incapaz de absorver o espírito.
Ora bem. A atenção dos alunos encontra-se, hoje, dispersa em extremo, o que orignia, sem dúvida, prejuízos sem conta! Para não ser vã e até infecunda, a tarefa do Mestre, urge pois , sacudir a alma estudantil, criando à sua volta um ambiente sugestivo.
Formar dois grupos, com diversos escalões, tem sempre validade. É tibre do jovem passar quanto antes ao grau superio ou então não descer na escala apresentada Nos primeiros anos, é ideal o desafio. Nenhum dos partidos quer perder a causa, Por outro lado, cria-se uma força, que actua poderosa, não apenas em um, mas em todo o grupo.
Não é só A ou B que, em certa ocasião, se dispõe a trabalhar, isoladamente. Agora, ao invés, é o bem comunitário que
actua em cada um e, ao mesmo tempo, nos outros todos.
Que o diga o Manuel do 2º em Ciências, a quem os outros pediram logo contas, por ter dado muitos erros!
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89 - O ti Cabral
Entre as figuras, deveras curiosas, da minha aldeia, emerge, sem dúvida, o ti Cabral velho.
Celibatário e muito devoto, ao menos dirante os anos em que vim
a conhecê-lo, escoava-se-lhe o tempo na igreja ou no forno.
Aqui, era ele, de facto, o encanto da pequenada, por noites longas de frio Inverno. O seu lugar, à direita da fornalha, estava reservado. Ninguém intentava apoderar-se dele. Na verdade, encontrando~se vago,, pouco tardaria a ser ocupado.
Figura exótica, mas apreciada, era o cronista de velhas tradições, que todos ouviam, com entusiasmo. Invejavam-lhe a memória, fiel e constante, assim como também a férrea saúde.Comesse feijões, a qualquer hora, nada importava! Folgazão e anedótico, esperavam-no sempre, com grande alvoroço!
Ali, pois, em frente do brasido, que pronto avermelhava suas
engelhadas faces, dava então largas ao vasto reportório, que desfiava, dia a dia,, com ar de novidade.
Hora para a deita nunca ele teve, em sua vida, que variava, decerto, com o andamento do forno comum.
Assim é que, tirado já o pão, guardando-se o borralho, num balde enorme e encostando à parede os trastes de uso, o bom do velhote começava a erguer-s, para a despedida.
A petizada via-o partir, com ar de tristeza, enquanto ele, risonho, ia dizendo: " Até amanhã, se Deus quiser!"
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90 - Ainda o ti Cabral
Vamos agora em surdina, rumo a sua casa.Melhor, por ventura, antecipemo-nos a ele próprio, afim de observar, lá no escuro. o que houver de interessante.
Como é sabido, num ângulo da loja, separado por cancelas,
encontra-se visível um momtáo de palha, com mantas de recheio.
Não há luz interior, que já conhece tudo, a olhos fechados.
Também as ovelhas não são obstáculo, que logo se afastam, de maneira cortês, quando ele chega, em plena escuridão.
Já o conhecem bem, pelo que o gado o chama diligente,com
balidos amorosos.
Para despejos, serve toda a loja, com excepção da palha em que dorme. Um breve desvio e... pronto! Não precisa, pois, de arrefecer nem fazer caminho longo! Levantar somente um pouco de mato, a servir de cobertura ao depósito recente! É tudo estrume, colaborando assim no trabalho das ovelhas.
Uma noite, porém, sem que ele suspeitasse, alguém se estendeu, no meio do rebanho, à espera da hora,em que vinha do forno
Como era Inverno, aquilo não falhava! Ia direitinho e breve como seta! Mas o ti Cabral metia no estômago toda a espécie de alimentos, incluindo feijões, ainda que fosse noite.
Sendo isto assim, tornara-se famoso, por efeitos sonoros, pois gases pestilentos se formavam em barda., no seu interior.. Dizia-se até que mandava para o ar em caso de aposta, a
quantidade que nós quiséssemos.
Foi na verdade o que alguém verificou, embora sem aposta,
nessa noite ingrata de gases mal cheirosos!
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91 - Testemunhas do Facto
O Manuel Diego e mais alguém.
Aguardam ansiosos que o velh0 ti Cabrai penetre na loja, onde o gado se encontra, para assistirem ali ao grande tiroteio, que logo se faz ouvir, transposto o limiar.
Começa brandamente e com certo espaço, entre cada unidade. Depois, há um leve crscendo, com notas picadas, até chegar à máxima altura, ponto culminane, em que faz fogo. Deois, breve suspensão!
Larga, em seguida, com folgo renovado, como em volata, descendo lento e afrouxando também, à medida que o fim se vai aproximando. Os últimos sons já são imperceptíveis. Vento? Sopro? Mau cheiro! De tudo um pouco!
Entretanto, apesar do esforço, o ti Cabral, em tais ocasiões, estava satusfeito.! Aliviava assim de um peso enorme, que muito o constrangia! Saía-lhe, pois, um fardo enorme das costas vergadas.
Em momento igual. é que o bom velhote, para horror seu e alto espanto, ouviu risos sufocados. Querendo explodir, não havia se facto, possibilidade!
Estrondosas gargalhadas fenderam em breve os ares empestados, no antro escuro.
A isto, agora, não foi superior o velho ti Cabral! A sua língua desata-se logo, não para cantar os louvores divinos,, mas
afim de largar palavras ofensivas e até indecorosas!Não mexia as pernas: soltava a língua! " Filhos da..... Filhos da...
Nestes apuros, só lhes valia a fuga veloz! Criado e amigo,
alapados entre o gado, ei-los já saindo, precipitadamente,enquanto o veho, bem mal humorado, continuava persistente o furioso monólogo!
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92 - Zé da Olímpia
Nascido e criado, em Aldeia da Serra, casou em Vide-Entre-Vinhas com Olímpia dos Prazeres, donde lhe veio, sem dúvida, o nome popular, que todos conhecem.
Diligente e simples como todos os serranos, dedica a vida à criação de gado, com vista directa ao fabrico de queijo.
O que, porém, deu fama ao ti Zé da Olímpia não foi, evidentemente, a sua profissão. É que ele, na verdade, gostava da pinga e, se começava, eram dias a fio!
Ora, acontecia que, sem maltratar fosse quem fosse, prestava-se a conversas um tanto bizarras, ostentando maneiras que ficaram para sempre, na memória dos coevos.
Lembro-me bem, como se fora hoje, das suas perlengas, feitas ao ar livre, sendo já noite. Embora a assistência fosse invisível, não
diminuía o seu entusiasmo.
Em cima duns paus, ei-lo assim, durante horas e horas, arengando em voz alta, cheio de vivacidade. quente e vibrante, de tal maneira, que o fazia irromper em vivas fogosos, de momento a momento.
Ainda tenho presentes alguns dentre eles: " Viva o senhor Prior das pombas! Viva o Salazar do mundo!"
Um dia, atirou-me com esta: " Seu pai é o homem mais intaligente desta freguesia!"
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93 - O ti Cabral
Vou agora vincar a faceta emergente do cronista oral de Vide-Entre-Vinhas. Chamo-lhe assim, por não haver escrito as suas Memórias, o que foi grande pena!
Efectivamente, sabia de cor, sem alteração, os factos mais antigos desta freguesia e dos seus habitantes. As. datas festivas ou ainda as lutuosas; acontecimentos vários de toda a natureza,
Quando alguém precisasse de qualquer informação, lá estava o to Cabral , como um livro aberto, para narrar fielmente e elucidar os espíritos ávidos. Por esta razão, toda a gente lhe queria e muito o apreciava.
Autêntico regalom em noites de Inverno, ouvie-lhe contar, à boca do forno, os factos ocorridos em Vide-Entre-Vinhas! O lugar de encontro havia de ser, necessariamente , o forno público.
Sem o ti Cabral, o serão não prestava!
Depois, assistia-lhe o condão de prender a assistência, que pendia, toda ela , de seus lábios já trémulos.
Por outro lado, a sua eloquência e a riqueza imensa de pormenores, tornava a exposição atrente e viva.
Muito raramente lhe cortavam a palavra e, se alguém o fazia, era para pbter algumas achegas, o que ele então, prazenteiro e lhano, procurava atender.
Numa palavra, o ti Cabral tornou-se, de facto, a alma dos serões e o aentro de interesse para toda a freguesia.
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94 - O ti Cabral
Quem o procurasse devia ser: no Chão, Dona Maria, na igreja ou no forno. Na exígua propriedade, o Chão referido, havia ao tempo várias macieiras que se avistavam, do caminho público, Rareando, na aldeia , as árvores de fruto, o
rapazio trazia-as de olho, esperando ensejo.
As primícias, em regra, não eram para os donos e, quantas vezes, sucedia não tirar-lhes a prova!
Afim de evitar esse enorme dissabor, passava o ti Cabral grande parte do tempo a guardar as maçãs, atirando, às vezes, cabadas de sacho aos mais atrevidos. É que ele tinha-as reservadas para o seu grande amigo, Padre Zé Maria. Ai de quem se atrevesse a deitar-lhes a mão! Saberia pagar caro tal ousadia!
Aqui, tornava-se ele, pois, o terror das crianças e dos mesmos jovens. Quase igual, também, apresentava-se ele, na igreja paroquial ou suas pertenças: adro e sacristia, sem faltar o campanário! Ali, perdia o ti Cabral a aura adquirida, junto da fornalha!
Deixava então de ser o relator ameno de factos antigos, para
converter-se no polícia-espião, que os petizes de Vide tanto receavam!.
Ainda assim, o ti Cabral era respeitado, porque os pais de
família lhe davam razão, naquilo que fazia.
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95 - O ti Cabral
A porta do forno acabava de de fechar-se e todos se encaminhavam a suas moradias. Tabuleiros à cabeça, trapo e ferra, em cima do ombro e caldeiro na mão, lá iam tacteando pela escuridão, em busca do lar.
Havia-se já feito a distribuição da bola usual, por todos os presentes, sendo muitos contemplados. E como ela escorregava, ao findar o serão! Por vezes, tinha carne também, sendo então gostoso saboreá-la devagar!
O ti Cabral quase sempre aceitava . Era muito rogado, motivo pelo qual , não querendo magoar, fazia a vontade a qualquer pessoa. Tasquinhando na bola, fazia logo caras à igreja
paroquial, a cujo lado se erguia a morada.
Constava ela de uma loja para gado e um andar assoalhado.
Não vamos julgar que dormia por cima! Não que ele havia frio!
Num ângulo da loja, mesmo junto às ovelhas, é que ele tinha a cama. À volta do sítio, uma cancela e, no interior, um montão de palha, para ali se encaminhava o cronista da aldeia!
Os animais do redil conheciam-no bem. Estavam, por certo, familiarizados, já de longa data. Por isso é que as ovelhas se punham a balir, quando o velho chegava, olhando para ele como um bom amigo, enquanto, na sua, pareciam dizer:" Por que não tinhas já vindo?! Estávamos aqui à tua espera!
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96 - O Lameiro dos Felizes
Esta propriedade fora arrendada e ficava longe do velho povoado. Ali pertinho. via-se a Cás do Moiro, que me dava. amiúde, voltas ao miolo! Haveria ali vertígios de remotas eras?! As mouras encantadas fariam seu assento, nesta região? Começou a interessar-me o dito Lameiro!
Um dia fui lá, seguindo meu pai, mas fiquei dasorientado,
porque, na verdade, nem era lameiro nem parecia lugar especial que desse ventura. Uma terra quase seca, azada somente, para magro pasto!
Duas presas modestas facultavam, na altura, o planntio das batatas, mas sempre, já se vê, em pequena escala! O que vi sedutor, para olhos de criança, eram duas cerejeiras, de copa avantajada, Por elas somente é que eu me obrigava, todos os dias
a fazer resignado o longo percurso, dando por boas todas as canseiras.
Também me encantavam os ninhos das rolas, que muitos havia, no arredor. Eram essas aves da minha predilecção e todo eu
vibrava, escutando seus arrulhos. Um belo dia, que vagueava por ali, avistei um velhote, baixo e já idoso -- o ti Zé Alfaiate. Observei-o, então, durante momentos
Procurava o bom homem duas vergas de giesta. para atar com elas um feixe de lenha, que havia juntado..
Este foi, na verdade, o mais velho homem que me chamou a atenção, quando era criança!
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97 - Ida a Celorico
Pelo tempo das mondas, fora eu um dia, ao Lameiro dos Felizes. Sucedia então que várias mulheres labutavam diligentes, nos trigais em flor, enquanto eu, deleitado, gozava a sombra de coposa cerejeira.
Com grande espanto meu, fui levado a acompanhar a ti Maria Cândida, a Celorico da Beira. Já me não recordo qual seria o motivo. Talvez, julgo eu, tirar a medida, para um fato novo.
Que prazer inebriante estar frente a frente a ricos edifícios,
que eu vira tantas vezes, lá da minha aldeia, quase embevecido!
A estrada nacional, as árvores grandes, o Ribeiro Pinheiro, a
Pedra da Abelha, o Marmeleiro -- nomes repetidps que , havia muito sabia de cor -- tornavam-se agora vivas realidades, que eu ia saudando, com imensa alegria!
Sentia-me ufano, de alargar assim, os meus horizontes! Os outros camaradas não tinham, por certo, essa oportunidade! Era
único, portanto, o que dava ufania a meus verdes anos!
E o velho Castelo, airoso, altaneiro, cujo perfil, algo meditativo e quase fidalgo eu andava espreitando, havia tanto já,
embora de longe?! Agora, sim, tinha-o ali , a 1oo metros apenas,
podendo, se quisesse, tocar-lhe com a mão!
Fui hoje à vila, dizia então, com altivez, pondo nas palavras sonora inflexão que traduzia orgulho?!
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98 - Às Confrarias
As primeiras palavras que eu aprendi, atentando no facto, mecanicamente, foram na verdade as que lembro ainda;-
às Confrarias. carro de linhas e pote de azeite. As outras que sabia
ouvia-as, de facto, mecanicamente, ficando gravadas, sem relação
com o seu objecto..
Aquelas, porém, ficaram noutra linhaaaaaa. já houve referência a concretizar, Achando graça à primeira palavra,, não pude conter-me, sem ver de pronto o objecto expresso!.
O ti Manuel Silva utilizara-a um dia, em conversa com meu pai. Urgia, seguidamente, verificar bem de que é que se tratava!
Afinal de contas, era uma propriedade, murada, a toda a volta. Ficava no camunho que leva ao Carvalhal, de que era vizinha.
Possuía à data, soberba mimosa, plantada em tempo, junto dum valado.
Sus belos muros, de pedra facetada, eram coisa invulgar, ali na aldeia. Via-se claramente que fora a poder de braço que a terra pedregosa, árida e sáfara, tomara em seguida aspecto de quinta., embora modesta.
Apesar de tudo, valiam bem mais as paredes circundantes que a terra de cultivo.
Em nossos dias, está devassada: o progresso tardio inseriu-lhe a estrada, de lé s a lés.
Fora já em tempos que o Padre Semião, pároco de Vide, levara a efeito essa árdua tarefa, mostrando-se ali como noutras coisas, verdadeiro artista
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99 - A ti Rosaira
De rua em rua, ei-la açodada, subindo balcões ... galgando escadas! A várias portas bate sorridente, que alimenta no peito a fagueira esperança de esmola avultada! Um pouco de toucinho... costeletas de porco e até, por vezes, a malguinha de caldo, verdadeira delícia!
Agradece comovida e retira-se logo.Todos os dias faz a mesma coisa, pois vê satisfeita que há boa vontade, na terra natal !E os belos "entrudos" que lhe mandam boas almas?! Chouriços e queijo, farinheiras e castanhas... Uma sorte feliz,z, que nem é bom falar!
Entretanto, à boa da ti Rosaira nem tudo sorria!
Nas maiores alegrias, há sempre um espinho, que dilacera o peito!
O seu grande inimigo era o rapazio! Não que lhe tivessem "osga!", mas tão somente, por gostarem de ouvi-la!
Se tivesse paciência, dando nós à língua, as coisas iriam melhor! Mas não! Proferia disparates, que faziam delirar o garotio.
Bastava dizer-lhe : Ó ti Rosaira, dei-te lá um foguete!
Aquela frase aludia ao pau a que ela se encostava..
A parte superior figurava, na verdade, a cabeça dum foguete., por causa dos panos que lhe atava, em redor, afim de evitar que magoasse as mãos
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100 - A ti Rosaira
Como já foi dito, usava a ti Rosaira um velho pau
, em cujo topo usava tiras de pano esgarçado. Pelo aspecto exterior, assemelhava-se um tanro a foguete ou morteiro, que fazia as delícias de todo o garotio.Assymm logo que a avistavam, subia nos ares a frase esteriotipada: Ó tia Rosaira, bote lá um morteiro!
Claro e sabydo que a boa da velhota perdia as estribeiras, dando-se então a palavras grosseiras, que assaz divertiam os meúdos gozadores! Ela, às vezes, não ficava por ali! Investia animosa,empunhando o fkagelo, que era a sua defesa, enquanton os olhos, já desbotados, dardejavam raios! Ai do papa- açorda que, nesse monento se não valesse das pernas!
Um dia, por bem pouco ela não me apanhou! O que valeu, realmente, foi uma corte, destinada ao gado, cuja porta estava
aberta.
O Joaquim Rainho, assim como eu demos prestesmente
às de Vila Diogo, pondo-nos firmes, atrás da porta, enquanto ela, sem norte, batia furiosa, ia desenrolando o esquema, emque nunca faltavam palavras de injúria, alusóes picantes e ditos choarreiros.
Tirando tais àpartes, a boa da ti Rosaira era mansinha, qual ingénuo cordeiro
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1o1 - A Palheira ( Outeiro)
Construção tosca,mas assaz franca, dispõe de rés-do-chão e meio andar. Está situada no lugar do Outeiro e tem aceso por dois caminhos.
Conheci-a logo, na verdura dos anos, pois era ali guardado o que as terras produziam, na sua maior parte, de modo especial o que era reservado ao grupo familiar: batatas e cebolas, grão e feijão, havendo ali de tudo, em grande abundância.
Logo em frente, moravam, ao tempo, duas famílias: Rosairo e Faustino. Às vezes, distraía-me bastante, com gosto imenso,
ouvindo cantar a vellha ti Coixinha, para adormentar os sobrinhos pequenos. Era ainda criança o António Rosairo e já o ensinava a trautear uma cantiga, que me ficou para sempre: " Auga desce\ Auga escói". Isto na voz do meúdo! Os dizeres repetiam-se, vezes sem conto!
Uma vez, perdemos a chave, tomando os vizinhos certas liberdades que lhes saíram caras! O nosso rés-do-chão era já utilizado, para alívio pronto dos intestinos. Foi ousado atrevimento que exasperou meu pai.
Desorientado, pois, ante a imundície, tudo arrebanhou, com a pá do sacho, enviando a mixórdia pela casa dentro! Recordo muito bem que ninguém se mexeu, lá no interior, embora houvesse gente, à data do facto.
Para grandes males, grandes remédios!
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102 - Abuso de Confiança?
Oferta aproveitada, em extremo grau!. Era dia de nercado, no lugar da Lajeosa. Segundo o costume, acompanhei meu pai ao exíguo povoado, já que havia coisas, para eu fazer: reparar no gado; segurar o chapéu; ir dar um recado...
Sinceramente confesso não me ser desagradável esta digressão. Ficava deslumbrado, quando via tanta gente a saudar o ti "Zaías"!
Tudo passou, na forma de sempre, à excepção do final!
No meu regresso a Vide-Entre-Vinhas, o ti Manuel do Adro ofereceu-me a burra, para eu cavalgar. Fiquei radiante, com esta lembrança, pois gostava imenso de andar a cavalo, fosse embora o caso em simples jumenta!
Sendo as coisas assim, não me fiz rogado, aceitando logo
a bela oferta!
Pega que pega, ferida pelas moscas e excitada aibda pelo calor, em breve espaço, avisto logo Aldeia da Serra e, em seguida, Vide.Entre-Vinhas. Jamais eu fizera o dito percurso tão brevemente!
O pior, no entanto, estava para vir! O ti Manuel do Adro
mostrava-se indisposto, uma vez que as pernas, já um pouco renitentes, chegavam-se atrás, na íngrome subida para Aldeia da Serra!
Que havia-de eu fazer?! Já estava consumado! Por que não me prevenia?!
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103 - O ti Faustino
Entre as personagens mais curiosas de Vide-Entre-Vinhas, encontrava-se ainda o velho ti Faudtino.
Não que fosse mau homem, porquanto de mau não tinha ele nada, mas pelo exotismo, se não até pela mentalidade, um tanto excêntrica, faziam-se reparos.
Quando lá em Vide "serravam a velha", (acto nocturno, constante de ruídos e diversas tropelias, à porta dos velhos,
em certo dia do ano), ele advertia sisudo: "Podeis fazer tudo, menos desfeitear o nome que tenho!"
Como se vê, era o ti Faustino um espírito aberto e com-. preensivo.
Seguia atentamente as casas da aldeia, que não matavam porco, para defender-se, quando lhe assacavam este desdouro.
Por isso, um dia em que o Fonseca lhe fez a pergunta " ó ti
Faustino, vossemecê, quantas vezes já matou?!"
Ele não se indispôs, bem entendido, mas logo atalhou, muito
senhor do seu papel:: Vós tamém já um ano num matastens!"
Era assim, realmente, o bom do ti Faustino! A ninguém fazia mal
e, quando atacado, fazia apenas o mal necessário.
Um belo dia, passou ele por mim, no sítio do Carvalhal,
quando eu regava, a poder de braço, as figueiras novas que havia
plantado
Então, encosta-se ao muro, fixa-me ali, por alguns
momentos, enquanto prepara curiosos dizeres " Cada pessoa tem
a sua mania: "Umàcuasião, eu ia prás Çores. No caminho,
vi um colega seu, arrebanhando hílare, com sua licença, toda a
merda e sujidade que havia, por ali. Servia-lhe para tanto a pá do sacho
que trazia consigo, habitualmente.
É que ele adubava a horta com estas excreacências!
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104 - Salsa Verde!
Na lista dos jogos, que mais apaixonavam
os rapazes do meu tempo, este ocupa, decerto, lugar primacial.
Era desconhecido, em Vide.Entre -Vinhas, mas um dia, mercê
dos esforços dum contemporâneo, o actual Padre Ilídio, tornou-se
de pronto, conhecido e amado pelos jovens de Vide.
A sua técnica era muito simples, apesar de tudo, cativava a
malta. Consistia meramente, em dividir, a rigor, os conpanheiros
da paródia, em dois grupos iguais , verificando, em seguida,qual a
parte que ficava e a que devia esconder-se, em lugares afastados.
De maneira geral, realizava-se de noite, devido a
circunstâncias do nosso viver e também porque assim era mais
:interessante: As trevas cerradas impdiam logo se descobrisse o
destino dos que estavam ocultos.. Por outro lado, havia tempo
disponível, após o trabalho.
Os que tinham pais, harto exigentes, que mandavam os
filhos recolher ainda cedo, viam-se obrigados a jogar de dia ou,
quando muito, durante o crepúsculo
Deitadas as sortes, um destes grupos corria célere, em
diveras direcções, procurando cada um o lugar mais esconso. que
não fizesse prever a presença de alguém. Por vezes, atrás dum
muro, bastante arruinado. outras vezes, uma pocilga; outras ainda,
a cobertura dum móvel ou de outro objecto, azado para isso.
Volvidos minutos, a parte que ficara lançava-se na aventura:
descobrir os primeiros. Entretanto, devia fazê-lo, sem deixar-se
apanhar.
Avançavam então, com grande cautela, não fossem colhidos
sem aperceber-se! Assim que algum deles era detectado, gritava-
se logo: Salsa verde, no João! Após isto, corria loucament para o
lugar do início.pois quem fora encontrado esforçava-se, ao
máximo. por tirar partido, no seu regresso, à custa do indiscreto
que o tinha denunciado ou, na falta deste, aos outros do grupo
cujas pernas falhassem .
Apanhando algum deles, vinha às cavaleiras , impante de
gozo Às vezes, a cavalgada era lenta,difícil, arquejante, por ser
longe o destino. e o caminho ígreme! Sucedia, não raro haver
hilaridade, quando o detector se deixava colher, sem dar conta do
caso!
Isto, afinal, acontecia amiúde, pois, de outro modo, quem
estava escondido, numa loja ou curral, um tanto desgarrado,
nunca mais de lá saía.!
Uma vez realizado este lance teatral, novas diligências eram
logo efectuadas, para descobrir os que faltavam ainda. Os passos
do grupo eram sempre decididos, leves e prudentes, afim de evitar
surpresas desagradáveis!
Quantas vezes sucedia ir de encontro a sérios obstáculos,
em que dava o nariz, ficando este esmurrado! Mas ninguém
chorava, por tais ocorrências! Muito ao contrário, continuava-se
alegre e bem humorado, pois a diversão enchia a nossa alma.
O carácter próprio do imprevisto é que seduzia! O espírito
de aventura dominava a todos e até aos mais lorpas. galvanizava a
Salsa Verde!
quarta-feira, 9 de setembro de 2009
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